Uma matéria de Flávia Pinho no ex-Comida da Folha lança a pergunta que não quer calar: por que essa moda thai “não pega” em São Paulo?” Lista o abre-fecha de restaurantes com essa “inspiração” nos últimos anos. Vão ali explicações dos entrevistados que culpam desde a falta de ingredientes “autênticos” (afinal, galanga não é gengibre!) até uma má vontade do público com sabores diferentes.
E se nos perguntássemos o contrário: “por que a moda thai deveria pegar em São Paulo, onde até cozinhas africanas e bolivarianas vem conquistando seu espaço?” Francamente, não vejo o porquê. Nós não temos uma comunidade de tailandeses em São Paulo, quando se sabe que são as comunidades de imigrantes que formam aquela demanda básica para que cozinheiros procedentes dessas origens sintam o entusiasmo mínimo para ir em frente. Há mais de 10 anos Nina Horta abordou isso e eu também dei meus pitacos, dizendo que a Tailândia é um país imaginário, como a Bulgária do escritor Campos de Carvalho. Ambas existem, claro, mas à sua maneira.
O modo brasileiro de a Tailândia existir é na imaginação de alguns cozinheiros que provavelmente se encantaram com a sua cozinha lá pelas bandas de Paris, ou mesmo dando uma razia por aquela distante Indochina. Aliás, a Indochina não existe. É uma invenção do colonialismo francês. E, como ficção, é melhor ler O amante, de Marguerite Duras, que se passa naquelas bandas, do que montar uma excursão para descobrir "raízes" de um imaginário parisiense, reminiscências nostálgicas de um mundo perdido.
Pois o mesmo ex-Comida trás também a notícia de um festival que vai rolar no Dalva & Dito, com o chef Felipe Schaedler, do restaurante Banzeiro, em Manaus. Vai ter chibé com abacaxi da Amazônia, formiga e pimenta baniwa; pé de moleque e banana com calda de cumaru.
Esse rapaz tem se notabilizado por correr atrás de cogumelos, em parceria com Alex Atala, tomando por base levantamentos científicos feitos por órgãos de pesquisa locais. Agora, vem a São Paulo declinar a culinária “da Amazônia”. Seu restaurante, a Vejinha de lá acha que é “o melhor da culinária amazônica”. Por isso mesmo fui bisbilhotar o cardápio do Banzeiro.
O que encontrei? Tem até camarão com catupiry, sardinha frita, molhos belle meunière, provençal, madeira; creme de papaya com cassis. A culinária mais velha possível, da qual São Paulo se livrou há muito. Manaus, no seu “melhor”, é um museu da comida "fina" presente já na primeira metade do século XX. Felipe Schaedler vem aqui pegar carona na Amazônia moderna do chibé, da formiga, do cumaru, conforme invenção de Alex Atala - e do mesmo jeito que outros teimam em inventar a Tailândia.
São Paulo é um lugar maravilhoso! No seu solo árido, onde arrasaram a comida caipira, tudo dá. Até essa hidroponia gustativa de raízes desenraizadas.
17/06/2015
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