06/04/2016

O salmão, os chefetes e a estultice do público

Se você perguntar para qualquer profissional de restaurante que sirva peixes, constatará que mais de 50% das  vendas é de uma só variedade: o salmão de aquicultura chileno. Em seguida, as tilápias e o robalo, e outras espécies menos votadas.

A tendência de se consumir produtos de aquicultura traz consigo novos riscos e desafios. Antes, nos preocupávamos com a extinção de espécies marinhas; agora, além dessa preocupação, há aquela relacionada com a própria saúde humana. 

Muito já se disse, especialmente fora do Brasil, sobre o envenenamento da carne do salmão por antibióticos e hormônios. O FDA norte-americano é bastante vigilante em relação a isso e por várias vezes proibiu a importação do pescado chileno de criadouro. No Brasil, em contraste, a moda do salmão só cresce e as autoridades, seguidas pela imprensa, fecham os olhos para os riscos. Certa vez me contou um alto funcionário do SIF que a política de olhos fechados se deve à natureza de um acordo comercial com o Chile, que nos obriga a aceitar as análises sanitárias daquele país como definitivas. Se isso procede, leiloamos nossa autonomia sanitária em troca de contrapartidas que favorecem poucos setores exportadores brasileiros.

Em fins de março, Josimar Melo resenhou (Guia Folha, 25 a 31 de março) o novo restaurante japonês Sarumon - que serve apenas salmão! “Eu não voltaria - conclui ele - mas a clientela parece não sair de lá”. É um caso sério, e extremo. 

Me recordo quando essa moda chegou ao Brasil e o peixe - então chamado salmon - era um verdadeiro signo de status de uma classe média que imaginava, assim, estar sofisticando seu gosto alimentar. Num dos restaurantes de que fui sócio vendia-se muito salmão! E preciso fazer minha mea culpa, à semelhança da que faz hoje Checho Gonzales na sua pagina do Facebook (“Fiz muitas cagadas na vida, uma bem grande é que trabalhei com salmão ate uns 7 anos atrás. Anotem essa ao lado do azeite trufado, acreditem ou não ainda tem cozinheiro que usa”). É o preço do aprendizado.

Mas o que realmente me surpreende é como nutricionistas e saudabilistas de varias estirpes incluem, gostosamente, sem qualquer espirito crítico, esse peixe, transformado num veneno potencial (esse aglomerado de antibióticos, hormônios e “ômega 3”, alimentado com farinha de pena de frango), nas dietas cujo objetivo é, contraditoriamente, a saúde. Não seria demais esperar de profissionais desse tipo que adotassem, mais do que outros, a suspeição como regra. Ao contrário, aproveitando a estultice do público, dá-lhe salmão! São potenciais envenenadores dos clientes. Assim como os chefetes que, cientes desses problemas sanitários, curvam-se ao gosto do público na expectativa de vendas fáceis. 

Essas conspiratas comerciais, aliadas ao silêncio das autoridades e à conivência da imprensa, nos levam a um beco sem saída. Mas nem tudo está perdido.

A imprensa noticia que o salmão chileno está sendo dizimado por um surto de algas, que reduzirá a produção enormemente, talvez triplicando o preço do quilo de peixe para o consumidor. Prevê-se que chegará nos próximos dias, a R$ 40/50 o quilo de filé! É uma excelente notícia!

Os chefetes alheios à saúde do público serão obrigados a procurar alternativas. As tilápias também subirão de preço e, por fim, talvez cheguemos à oportunidade de consumir bons peixes marinhos que hoje são desprezados por força desse vicio do público.


Acredito que os chefs, com sinceridade, gostariam de ser guias da excelência alimentar. E acredito que, muitos deles, deverão fazer o mea culpa, seguindo Checho Gonzales, prometendo se emendar e, daqui para a frente, recusar seguir as preferencias irrefletidas do público, eliminando de uma vez por todas esse peixe dos seus cardápios. A oportunidade nos é trazida, agora, pelo surto de algas que dizima os malditos peixes chilenos…

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