04/09/2018

O imbecil e o escárnio. Um cenário de cinzas



Muita coisa se disse e muita será dita sobre a tragédia do Museu Nacional, o incêndio do Reichstag da ciência brasileira. É como se o meteoro de Bendengó tivesse caído sobre a ciência, e não tivesse sido levado pra lá em memorável campanha pública que reuniu condições e recursos para deslocá-lo do sertão da Bahia para o Museu no longínquo 1888.

O acontecimento não mostra apenas o descaso da ciência no Brasil. Serve também para mostrar como o poder atual cultiva a imbecilidade. O presidente da república estava obrigado, pelo cargo, a vir a público se manifestar. No entanto, mandou o seu ministro da Secretaria de Governo, Carlos Marunvir a publico chantagear a opinião pública traumatizada.

Ao falar da falta de recursos do governo, lembrou que não teremos dinheiro para museus enquanto não tivermos  “um orçamento eficiente no Brasil enquanto tivermos uma responsabilidade fiscal e uma previdência”. Culpou o Congresso.

Não bastasse a chantagem em favor dos objetivos do governo,  acrescentou:  “outros museus têm problemas de verba e deveriam buscar “recursos próprios” para se manterem. “Museus têm que ter fonte de recursos próprios. O Brasil tem centenas de museus importantes e tenho convicção de que temos dificuldades de manutenção em muitos deles, principalmente naqueles que não têm uma sustentação própria”.

Como se não bastasse, para ele, apareceram “viúvas chorando” o ocorrido, mas que “não amavam tanto assim” o museu. “Agora que aconteceu, tem muita viúva chorando (...) na televisão eu não vi ultimamente alguém destacando a história do museu, valorizando o museu para que ele se tornasse mais amado pela população. Está aparecendo muita viúva apaixonada, mas essas viúvas não amavam tanto assim o museu em referência”. O homem que vê televisão como forma de conhecer o Brasil.

Trata-se de um imbecil, escalado para o escárnio. Um imbecil que fala pelo governo, para expressar uma opinião igualmente imbecil deste, já que o porta-voz não foi desmentido.

Só a distancia do mundo real pode levar alguém a confundir museus privados com o maior e mais importante museu do país, de responsabilidade exclusivamente pública há séculos. Só o governo pode ser responsabilizado por essa tragédia.

O meteoro de Bendengó não precisava ser amado para ter caído no Brasil. No entanto, caiu e foi amado – mobilizando o país para preservá-lo no Museu Nacional. Essa pedra, de mais de 5 toneladas, estava no Museu desde 1888. A natureza não precisa de amor. As espécies naturais conservadas no Museu não precisavam de amor.

A única coisa que precisa de amor do Estado é o bem público e as coisas que estavam reunidas no Museu lá estavam por um lampejo de alguém que identificou naquilo um bem público. Ao longo de séculos. E foi preciso tanto descuido, tanta omissão, para que o bem público se transformasse em objeto de desdém, em cinzas.

Esse cidadão, Carlos Marun, foi escalado pelo governo para o escárnio. E ficamos sabendo, no susto, que o governo criou o cargo de escarnecedor oficial. O governo Temer entrou em metástase.

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