22/02/2009

Burguesia faminta: reorientação do gosto

O que mais admiro no profissional Alex Atala é sua capacidade de renovação e como ela segue um faro comercial impecável.
Alguns anos atrás, quando o conheci, fiz um perfil dele para a Trópico. Lá se lê: “Não quero fazer a nova cozinha brasileira, mas mostrar que se pode fazer gastronomia, alta cozinha, com ingredientes brasileiros”. Uma cozinha de terroir, digamos assim. Trazer à mesa os ingredientes brasileiros. A inclusão do foie gras em vários pratos ele explica: “Brasileiro não gosta de cozinha brasileira e se eu não agregar valor aos pratos não há aceitação. Veja bem: se você der uma série de farinhas de mandioca para um baiano provar ele te dirá qual é a melhor. Dentre os clientes dos restaurantes de São Paulo, qual é capaz dessa proeza? Nenhum! Por isso preciso agregar valor reconhecível como tal –foie gras, trufas”( “Atala e o DOM que surpreende”, in Luiz Horta, O melhor da gastronomia e do bem-viver, São Paulo, DBA, 2004, pág. 60).
Pois bem. Agora, em entrevista a Janaina Fidalgo (Folha de São Paulo, Coluna Mônica Bergamo, 21/02/2009), Alex declara: “"O D.O.M. assume sua primeira vocação: ser brasileiro! Por este motivo, renuncio ao uso de foie gras e trufas [...] Nos últimos dois anos, se eu pudesse fazer uma autocrítica do meu restaurante, é a de o D.O.M. fazer o que mercado faz. E isso não quer dizer que ele ficou pior, quer dizer que o mercado acelerou, melhorou. Vou dar um passo à frente [...]No jantar que fiz para os chefs espanhóis aqui, ninguém lembra do foie gras. Lembram do turu, da mandioquinha, dos ingredientes que não conheciam".
Ele tem razão: “Hoje, você vai comer pipoca no shopping e tem manteiga de trufa. Vai numa temakeria e tem foie gras” (atenção Jun Sakamoto!).
Não acho que a burguesia paulistana vá comer farinha de mandioca. Mas Dalva & Dito mostra uma tendência importante: a mudança de valores à mesa dos que andam de Cherokee, Hilux & que tais. O primeiro impacto foi sobre o próprio DOM.
Falta a Alex, agora, se livrar das lâminas de ouro – essa trufa/foie gras mineral - que decoram sua sobremesa com priprioca. Ele conseguirá!
Comi ouro, pela primeira vez, no restaurante de Gualtiero Marchesi, em Milão. Era a época dos ricos do petróleo, e o seu riso al´oro me deu a impressão de uma isca no anzol para fisgar aqueles magnatas orientais que supunha de hábitos alimentares bárbaros.
Implico com o ouro. Talvez me falte uma “educação para o ouro”, sei lá... Uma degustação vertical: ouro aluvião, ouro de profundidades variáveis, ouro de terroir... Mas achava graça naqueles dentes de ouro dos ciganos que já não se vê mais. Ouro pra mastigar, não para ser mastigado.

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