22/07/2009

Do caldo ao fond, do fond ao caldo

Historicamente, os fonds da culinária francesa derivaram dos vários tipos de pot-au-feu. São a essência deles, filtrados e apurados.
Sistematizados por Carême, expressavam o âmago das coisas de comer, a alma capturada em meio líquido. Passando ainda por Escoffier, essa linha de desenvolvimento chega a Ferdinan Point que dizia, na forma de trocadilho: “Eu acredito, do fundo do coração, que se vai ao fundo [“fond”, que sempre usava no singular] dos molhos como ao fundo dos poços: é lá que está a verdade”.
Pedaços de um animal, legumes e ervas – eis a base, o princípio de tudo na Alta Cozinha. Depois vieram os coulis, da nouvelle cuisine, deixando as coisas falarem por si, sem necessidade de extrair-lhes a alma e concentrá-la pela longa cocção. E os fonds, voltaram à simplicidade, por inspiração de chineses e japoneses: caldos rápidos, aromáticos, sem concentração e "achatamento" do gosto. A alma, o gosto, flanando na água. Em termos ocidentais, se aproximaram, conceitualmente, do brodo italiano.
Na culinária do Pará, que é uma cozinha de águas (as coisas saem do rio para mergulhar nos caldos das panelas), os fonds aparecem de forma bastante simples, sem necessidade de reduções e longas cocções.
As arrêtes de peixes, como os belos espinhaços de pescada amarela da foto, alguns legumes, arromatizantes, e estamos conversados. A qualidade do caldo é um fim em si, não a base para desdobramentos em molhos elaborados de modo complexo.
Entre nós, no Sudeste, não se vendem coisas assim, como no Ver-o-peso. Se você quiser fazer um simples caldo, precisará ir atrás do peixeiro, pedir o favor de lhe arrumar o descarte dos peixes que ele, fuçando no lixo, lhe dará de bom grado. Falta-nos a ciência dos caldos simples e saborosos.

0 comentários:

Postar um comentário