20/07/2009

Remanso do gosto em Belém

Foi por mero acaso. Topei com o Thiago Castanho em Belém, no restaurante Dom Giuseppe, onde trabalha sua namorada, Iuca, jovem engenheira de alimentos. Foi um prazer e grata surpresa reencontrá-lo, depois de dois anos da minha primeira visita ao restaurante da família, o Remanso do Peixe. Combinamos ali mesmo um jantar, para sete pessoas, dois dias depois.
No dia seguinte fomos juntos ao Ver-o-peso. E ele nos convidou para, no dia do jantar, fazermos um passeio de barco, almoçando no Saudosa Maloca, numa ilha logo em frente a Belém. E lá fomos nós, com o “casal vinte” da culinária paraense. Pela duração do passeio, temi pela preparação do jantar.

Ledo engano. Às sete e meia lá estávamos, empunhando um vinho rose do Douro e malas prontas para rumarmos para o aeroporto, em direção a Macapá.
Thiago mostrou as modificações no restaurante, ampliado em espaço e conforto nesses últimos anos. Nos acomodamos no salão e logo veio a entrada: uma casquinha de caranguejo no copo, coberta com farofa e uma patinha de caranguejo frita empanada. Uma entrada delicada, equilibrada, sem aquele empanturro de bechamel ou equivalente que usam por aqui para ligar desnecessariamente a carne do crustáceo.
Depois, bem, depois é que foram elas: umas lagostas grelhadas com farofa de cebola frita; moqueca paraense; filhote na brasa, acompanhado por farofa de banana e batatas-doces grelhadas. Tudo junto, para que cada um se servisse ao bel prazer, como numa mesa brasileira farta de um tempo que vai ficando para trás, substituída pela andadura compassada, consagrada nos cardápios de restaurantes.

Por mais que goste de lagosta, e por mais que tivesse saudades da moqueca paraense, foram o filhote na brasa e seus acompanhamentos o ponto alto da refeição. Aliás, em ponto perfeito: crosta crocante, interior úmido e macio, sabor sem igual. Sem falar da farofa de banana que, de acompanhamento, parecia um prato em si. Foi uma refeição e tanto, de agrado geral para os sete paulistas deslumbrados à mesa. Pessoalmente, prefiro a pescada amarela de Belém ao filhote. Mas o prato balançou minha convicção.

As sobremesas, saborosas, todas com coisas da terra – fruta pão, cumaru, bacuri, castanha do Pará, etc – recebem nomes clássicos de fantasia: tiramissu, creme brulée, pudim. “Mesmo assim, o pessoal aqui tem muita resistência a esses experimentos”, diz consciente da impropriedade.

Seguramente o Remanso do Peixe é o seguidor e sucessor na linha de revelação da rica culinária local, iniciada por Paulo Martins e sua mãe no Lá em Casa. Apesar de muito jovem (tem apenas 21 anos), Thiago já evidencia amplo domínio das coisas da terra.
Me mostrou, no Ver-o-peso, muito desse saber. “Veja isso aqui. É a botarga que vocês tanto apreciam”, disse me mostrando os saquinhos pendurados numa barraca, com ovas de tainha salgadas. E me apresentou onde se escondiam a baunilha da Amazônia, o cumaru, a priprioca... Apenas a iquiriba ou embiriba (Xylopia sericea), que mostrei a ele, ele não conhecia. Ufa!
Thiago Castanho será o Rodrigo Oliveira da culinária paraense. É apenas questão de tempo. Também de um pouco mais de exposição na mídia especializada que, apesar de lerda, sempre acaba chegando lá. Ele se formou no Senac Campos de Jordão. Esteve por seis meses em Portugal, com Victor Sobral. Quando o encontrei pela primeira vez, me fez um horrível tamuatá (culpa do peixe, claro, que eu insisti em experimentar) e um excelente pitu na brasa, além da moqueca paraense – que é um pout-pourri de coisas da terra à maneira de moqueca.
Mes que vem, o irmão de Thiago, Felipe, é que virá para o Senac Campos de Jordão iniciar a sua formação. Em breve, numa família que não era "do ramo", teremos dois especialistas. É essa multiplicação de jovens talentosos que acabará por fazer a hora e a vez da gastronomia brasileira.

1 comentários:

Claudio Moeiro disse...

Carlos, segundo o site do proprio, Vitor vai sem o C. Abs.

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