20/08/2009

Trinchar


Sempre achei uma barbaridade a tesoura de trinchar e sua potencialização, a faca elétrica. Por que levar o esquartejamento à mesa? Imaginei rememorações rituais da guilhotina. Sempre preferi chegar a um ponto de cocção onde é possível desmontar o animal nas juntas, com o auxílio de uma faca e um garfo.
Pois não é que Gualtiero Marchesi apresenta uma interessante análise (La tavola imbandita. Storia estetica della cucina) da “representação convivial como rito de demolição”? Ele centra a análise na dimensão coreográfica, no espetáculo decorativo que é o trinchar – atividade que exige conhecimento de anatomia animal e que, após o Renascimento, recai sobre um especialista.
Especialista que se pauta por um código do desmantelamento. Absolutamente necessário quando a prioridade gastronômica, a seleção das melhores partes, se dá segundo a expressão da hierarquia social à mesa. O trinchador é um distribuidor de “justiça” à mesa pos-renascentista. Lendo e aprendendo.
E o que ela faz à nossa mesa? Acho que quase não existe mais, porém ainda se fabricam. Mas a faca elétrica - esta se propaga... e me evoca Freddy Krueger entre os comensais. Sinal dos tempos, pois nele também existe algo de "justiceiro".

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