Tem gente que não gosta muito de Hervé This por entender que é um pirotécnico novidadeiro e nada mais. Por mais que se esforce para se apresentar como cientista, sua imagem é muito afetada pela estrepolia que fazem com suas descobertas na cozinha. É uma forma de desqualificar o seu trabalho, destituindo-o do que é o essencial.
E o essencial são as discussões científicas que propõe em torno da culinária. Como num post recente onde enuncia tópicos relativos a questão da toxicidade alimentar. Um assunto sobre o qual Santi Santamaria criou recentemente muita celeuma, contrapondo-se a Ferran Adrià.
No post, Hervé This escreveu:
Por que não manter as melhores aplicações da química, por um lado, e, por outro, o melhor que produz a "natureza" (lembrando-nos, no entanto, que a cozinha não é natural, mas artificial)?
Na realidade, eu me deixei levar por algo inútil: ninguém convence ninguém, e prefiro ser mais assertivo, dizendo o que parece justo.
Fatos que não devem ser esquecidos em nossas discussões:
1. Nós somos a primeira geração na história a não ter conhecido a fome na França ...
2. Mas ainda existem milhões de pessoas que morrem de fome no mundo
3. A questão da alimentação mundial não está resolvida
4. Não será uma agricultura ingenuamente "natural" que alimentará o mundo todo.
5. As questões da terra e da água tornam-se graves.
6. É natural o que está na natureza sem transformação do homem. Nossos alimentos, selecionados por milênios, são realmente naturais?
7. Assim, a cozinha é artificial
8. Não tenho nada para vender
9. Apesar do que é dito sobre as intoxicações alimentares devidas à química (infelizmente confunde-se a química e suas aplicações), a expectativa de vida nos países industrializados continua a aumentar. O que isso indica?
10. Perdoem-me ao repetir o ato de fé que está no meu site
Várias dessas assertivas merecem discussão aprofundada. Chamo a atenção para um aspecto: Hervé, por ser um cientista, é dos poucos que, na área da gastronomia, compreende o artificial de toda a nossa alimentação, mesmo aquela que parece natural. Trata-se de um ponto de vista estritamente materialista.
A rigor, e sob a produção capitalista em especial, a natureza é uma abstração. O homem construiu culturalmente a sua “segunda natureza”, inclusive domesticando (e transformando pela seleção artificial) as espécies úteis.
Os defensores naïfs de uma cozinha “orgânica”, “natural”, e tantos outros adjetivos, deveriam pensar nisso a sério. Certamente redirecionariam suas energias contra os verdadeiros inimigos do bem estar humano, em vez de despendê-las propagando as novas religiões do “comer puro”.
Nota: escrevi “assertos”, e não “acertos”, porque são afirmações, assertivas, e não necessariamente coisas certas. (Há gente que acha, por exemplo, que uma alimentação livre de agrotóxicos poderia, sim, resolver a fome no mundo desde que sob outro sistema social...). O importante é que, em ciência, tudo é apenas provisoriamente certo. As certezas férreas estão do lado da fé.
10/09/2009
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