As gorduras dos ricos não são muito diferentes das gorduras dos pobres, é o que se constata ao continuarmos raciocinando sobre os números da Pesquisa de Orçamento Familiar do IBGE, como fizemos ontem para o leite, o açúcar e o leite condensado.
Por puro preconceito, sempre achei que a culinária do povão fosse a mais gordurosa. Acho que a impressão me ficou de uma baiana que trabalhou em casa e fritava os bifes em deep-fry. Espantou-se com a grelha e dizia que, em sua casa, se consumia 5 litros de óleo por mês. E também me impressionam sempre o pastel de feira e o acarajé pela copiosa gordura em que são mergulhados.
Já confessei: puro preconceito meu. Pois os brasileiros consomem, em média, 10,2 quilos de óleos e gorduras, ao passo que os que ganham até um salário mínimo consomem 8,3 quilos e os do estrato de renda superior (mais de 7,5 salários mínimos) consomem 10,9 quilos. Mas, especificando as principais gorduras, aparecem algumas diferenças interessantes.
A manteiga, por exemplo, tem um consumo médio brasileiro de 324 gramas anuais; os que ganham menos de um salário mínimo, comem 191 gramas, os que ganham mais de 7,5 salários consomem 661 gramas por ano. Com a margarina se dá o seguinte: o consumo médio brasileiro é de 1,6 quilos; os que ganham menos consomem 958 gramas e os que estão acima da faixa dos 7,5 salários, consomem 2 quilos. É interessante a preferência geral por uma gordura de baixa qualidade como a margarina. Em todos os níveis de renda ela suplanta o consumo de manteiga. Por que quem poderia consumir mais manteiga prefere margarina? Será por conta da ideologia light, da qual seu marketing conseguiu se apropriar?
Contudo temos o caso da banha de porco – o anti-light. A média de consumo brasileiro é 350 gramas anuais. Ricos e pobres quase se encontram na quantidade: 252 gramas os mais pobres, 218 gramas os mais ricos. Mas é nas classes intermediárias de renda que o consumo de banha de porco cresce. Com 2,5 salários mínimos de renda o consumo de banha de porco é de 580 gramas, decrescendo à medida que a renda sobe ou baixa.
Na categoria dos óleos vegetais, temos o caso do óleo de soja, quando o consumo dos estratos superiores e inferiores de renda são muito próximos: 6,5 quilos e 6,6 quilos respectivamente, sendo que sobe para 8,2 quilos na faixa de renda de 4 a 7,5 salários mínimos.
Já o perfil “classista” dos demais óleos é mais nítido. O de milho, com média de 186 gramas, cai para 51 entre os pobres e sobe para 654 entre os ricos; o de canola, média de 91 gramas, cai para 2 gramas entre os pobres e, entre os ricos, atinge 391 gramas. Isso quer dizer que o óleo de canola pertence ao topo da pirâmide social. Canola não existe, é apenas uma sigla CANadian Oil Low Acid – e é óleo de uma variedade de colza. O óleo de milho: 91 gramas nos estratos inferiores de renda contra 391 nos estratos superiores; o de girassol, 32 gramas contra 425 e, finalmente, o de oliva, 70 gramas contra 497 gramas entre os melhor postos na escala de salários.
Assim, além de variar segundo o “gosto” e as receitas, as gorduras e óleos se distribuem pela população de modo bastante coerente com a renda.
18/11/2009
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9 comentários:
Dória, seria possível fazer uma comparação de consumo de gorduras entre zona urbana e rural? Acredito que em qualidade, quem mora no campo deve estar muito a frente.
Doria, leio seus posts com admiração e sede de aprendizado. Esse ranking de consumo de óleos e gorduras me chamou bastante a atenção, e percebi que o consumo de azeite não foi quantificado. Abraços!
Leo, infelizmente os dados da POF não permitem esse tratamento. Eles apenas distinguem o Estado como um todo e a região metropolitana
Adriana,
obrigado pelas palavras gentís. O azeite de oliva está lá, sim! No final do penúltimo parágrafo. Abraços.
Olha, quando a margarina não sei se poderia considerar uma "ideologia light" de que ela se apropriou, pois de margarina para manteiga, ambas são gordura e caloricas, até porque o termo light não estaria bem usado aqui. Se fores buscar no ministério da saúde o termo light pode enganar muito consumidor por aí. Eu diria pela "cara saudável" que ela conseguiu adiquirir e que faz pouco tempo que essa "lenda" caiu. Afinal, o que se considerava saudavel, ou seja, melhor que a manteiga, acabou trazendo o fato do que se chama agora de gorduras trans (considerado muito mais maléfico do que uma gordura saturada como a manteiga. PS: De que ano sao os dados?
Os dados da última POF são de 2002-2003. Ano que vem sai a próxima e, ao que dizem, com muita surpresa.
E a gordura vegetal hidrogenada, presente em quase a maioria dos alimentos industrializados? O famigerado chocolate hidrogenado presente nos granulados dos brigadeiros?
Pois se não me engano, até 2003 não tinha passado ainda o boom da gordura trans e de como ela faz mal, por isso todos ainda deveriam consumir muito mais margarina achando que eram pessoas saudaveis.
Nos resta esperar os resultados do próximo ano.
Doria, perdão pela minha falta de atenção (e olha que eu disse que o texto me chamou atenção...).
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