15/12/2009

Os doces natalinos

Mais do que qualquer época do ano, o Natal se presta à manifestação clara das preferências familiares em matéria de comida. Sempre discutimos o cardápio com boa antecedência, todo mundo palpitando, sugerindo algo, vetando alguma coisa e se chegando ao compromisso que, invariavelmente, é uma variedade e quantidade de coisas que, em sã consciência, está muito além da capacidade de se comer numa só refeição.

Na minha família nunca houve o culto ao peru. Lembro de uma época na qual predominava o enjoativo “tender” com frutas, mas não o peru. Por isso sou capaz de contar nos dedos as vezes na vida que comi peru. As carnes variam no Natal.

O mesmo não ocorre com os doces. Há um bolo de nozes que minha mãe faz e que expressa a própria essência do Natal familiar. Além disso, todos aprovam com entusiasmo a idéia de incluir o turdilli calabrês ou o strufolli napolitano nas comemorações, como ocorrerá nesse Natal. Não que isso ocorra todos os anos, mas de vez em quando eles ressurgem, em visitações, do fundo da memória familiar.

Meu avô napolitano adorava ambos, e enquanto esteve vivo foram obrigatórios nas festas natalinas. Com o tempo, foram caindo em desuso, mas voltam sempre, como a dizer “não se esqueçam, vocês são os mesmos!”.

Curioso é que, em torno desses doces, se articula uma discussão culinária, contrapondo verdadeiros partidos. Há muitas décadas – reza a história familiar – uma tia-avó deixou de fazer o strufolli frito para fazê-lo assado. Para uns foi um progresso, para outros, um retrocesso. Ainda não se estabeleceu um juízo definitivo. Mas o certo é que dá muito trabalho, pois é cortado em pedaços minúsculos, perdendo, assim, para o turdilli.

No caso do turdilli, vejo hoje que a receita familiar é uma simplificação extrema das que encontro em livros e outras fontes. Mistura-se vinho tinto e azeite de oliva em proporções idênticas, acrescentando a farinha até se poder trabalhar a massa com as mãos, fazendo pequenos nhoques a serem fritos, misturando-os depois ao mel diluído em pouquíssima água.

Não sei se a simplificação é a memória remota da Itália que o tempo vai apagando. Mas sei que a nossa “identidade familiar” não fica abalada quando não se faz o turdilli. É sempre um tema nas comemorações, entre juras de que, ano que vem, ele não faltara. Falar sobre ele tem um valor quase idêntico ao comer.

2 comentários:

Breno Raigorodsky disse...

Bonito

Ana Cristina disse...

Adoro quando fala dos doces!
Feliz Natal!
Ana Cristina
http://bolocasamento.blogspot.com/

Postar um comentário