Dentre os papéis que o bom jornalismo pode exercer, um é identificar tendências. Excelente a reportagem de Maria da Paz Trefaut na revista ValorInveste de fevereiro 2010. Uma matéria inteligente sobre a volta do picadinho, confrontado com a velha moda do estrogonofe.
Entrevistando donos de bufês, ela nos indica que, cada vez mais, o picadinho é solicitado em recepções (almoços, casamentos, etc). Paulistas e cariocas parecem, desde 2000, preferir este prato nacional ao estrogonofe, que teoricamente ficou “cafona”.
Lembro que, ano passado, num almoço de turma de um colégio de elite, o cardápio foi todo “nacional”, das entradas à sobremesa. Se essa moda realmente pega, haverá uma demanda forte pela culinária brasileira que acabará ganhando mais e mais os restaurantes. Picadinho, escondidinho e coisas assim despontam aqui e ali.
Claro, a questão da ortodoxia sempre reaparece, e brasileiro tem tara por picadinho. Todo mundo sabe fazer algum, e o de carne é apenas um caso particular dessa mania nacional que leva de roldão abobrinha, chuchu, couve, quiabo, etc. O estrogonofe "pegou" porque alimentava a mania nacional de picar, agregando ares de sofisticação.
Até Chico Picadinho, um serial killer dos anos 1960, boêmio, fazia das vitimas picadinho. Depois de preso, foi solto por bom comportamento e fez de sua noiva um novo picadinho! A coisa era mais forte que ele. O detalhe: esse Chico emblemático era cozinheiro profissional.
Manezinho Araújo, que foi barman bastante rodado pela noite paulistana, garante que o “verdadeiro picadinho” era feito "na ponta da faca", de bife de filé mignon na frigideira, picado depois de grelhado, voltando a uma demi-glace enriquecida com molho inglês e flambado com conhaque. Coisa rápida, à minuta, nada de longas cocções; acompanhamentos de praxe. Quando, no Nabuco, faziamos o picadinho hoje corrente, Manezinho resmungava: "vocês não sabem fazer picadinho!"
Aquele de bar era picadinho porque o sujeito já não tinha forças para ficar cortando e mastigando, mastigando... Por isso era prato capaz de encarar um fim de noite, levantando o boêmio. E se comia no balcão, não na mesa. Era item de bar, não de cardápio de mesa. Era o que serviam, por exemplo, no antigo Padock, na Baiúca centro, etc. Bem antes dessa modinha corrente dos temakis. Mas estes devem ser melhores para a ressaca de frozen sakê e outras frescuras refrescantes.
19/02/2010
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2 comentários:
Picadinho imbatível é o do restaurante Fred, de Brasilia, curiosamente inaugurado por um austríaco que veio lá pelos idos dos anos 1960 e criou o prato, com algumas adaptações locais, que até hoje é carro chefe do lugar. É feito em uma frigideira enorme à mesa do cliente (coisa dos carrinhos, parece que se está no Don Fabrizio dos anos 1960 e 1970, de São Paulo), é acompanhado de arroz e farofa. Sem ligar para altos e baixos, o restaurante vive lotado. Imperdível para quem vier à capital.
Abraços
Janine
Dória,
onde anda o Mané e o Aquino? Bateu uma nostalgia...
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