16/08/2012

Leitor de 5ª: muita cerveja, pouco foie gras

Você, que ainda acredita naquela ficção que é o “foro íntimo”, pode tirar o cavalo da chuva. O Estado pós-moderno está pouco se lixando para as suas escolhas.

Arnold Schwarzenegger foi governador da Califórnia até 2011. Aquela gente que elegeu o Exterminador do Futuro é a mesma que, agora, celebra uma lei que proíbe a produção e venda do foie gras em seu território. Povo estranho, sem dúvida. Mas há 34 anos a Unesco divulgou um documento chamado “Declaração Universal dos Direitos dos Animais” e esses californianos são agora seus intérpretes fundamentalistas.

A “humanização” dos animais estigmatiza aqueles que os tomam por alimento. O antigo “it”, que era reservado para eles na língua inglesa, foi substituido por “he” ou “she” - em resumo, a natureza é representada agora como um imenso zoológico “pet”. O ganso, personagem da fábula do patinho feio, até encerra uma moral. Na outra ponta, longe dos pets, vislumbra-se um jardim botânico comestível. Mundo besta.

Libertar os gansos da gavage, parece ser a palavra de ordem desse humanismo que não titubeia em destruir os países orientais em defesa de não se sabe o que. Triste fim desses guerreiros natos, policiais do cosmos que acabaram como fiscais de galinheiros. Querem, para os gansos, um galinheiro melhor do que Guantanamo - lembra um leitor.

Eles recusam o monismo, que não vê sentido na separação entre espírito e matéria. Postando-se do lado do “espírito”, não suportam o “sofrimento” dos gansos, que lhes parece mais terrível do que picar um alho porro. E parece não lhes dizer respeito a degradação de espécies domésticas como o salmão ou o frango. Pois é sobre o triunfo parcial desse mundo medíocre a principal matéria de Comida de ontem.

A outra matéria do Comida é sobre compras pela internet. Mas parece que só se compra coisa “especial” na web, o que não é verdade. Então faltou, por exemplo, uma análise crítica do delivery do Pão de Açúcar.

Comida ainda noticia que Paola Carosella se encheu do próprio menu e anda a fazer outro a quatro mãos, com um cozinheiro uruguaio. Valerá conferir. Josimar resenha o restaurante-bar-lounge de nome 00 São Paulo. Diz que a gastronomia da casa sofre diante de sua vocação para bar. Luiz Américo, resenha o Beato, na rua dos Pinheiros. Acha que ainda falta personalidade aos pratos.

Neide Rigo, quinzenal, nos aparece com o mangarito a tira-colo, “produto orgânico por natureza” (sic). O leitor, que terá dificuldades em encontrar mangaritos, pode respirar aliviado ao saber que “comer mangaritos (não) o levará à epifania”.

Boa matéria sobre a feira boliviana, no Pari, no Paladar. É um super-progama dominical para os paulistanos.

A coluna de Alexandra Corvo agora será quinzenal, alternando com a nova coluna de um químico-baterista-gaúcho (não é pouca coisa) que escreverá sobre cervejas. As cervejas não tem tanta importância assim como o vinho em nossas vidas-gourmets. Os vinhos exigem muito mais atenção. Saudades prévias da Corvo.

A capa do Paladar é também sobre cerveja. A cerve-chateação é um universo em expansão, a roubar terreno da eno-chateação. Como diz Paladar, o bebedor de cerveja é aderido a um estilo de vida. Não é o meu. Prefiro a minha parte em água tônica. Mas Luiz Horta, no Douro, mostra que nem tudo está perdido.

Paladar lança mais uma campanha para escolher um crítico como jurado do Premio Paladar. Dentre as coisas que se exige: não ter envolvimento ou interesse em bares, restaurantes e lanchonetes. Uma visão miúda de "independência". Melhor seria se considerassem apenas os textos, não os "interesses". Uma nova Nina Horta (que tem "interesse" num bufê) não passaria no concurso do Estadão...

3 comentários:

Léo disse...

Bom dia Dória,
O Sacoleiro sem fonteiras foi aposentado? Era uma coluna muito interessante. Dia desses, estava pensando se ele não poderia fazer uma visita aos mercados municipais de São Paulo, coisa que os suplementos e revistas especializadas ignoram. Digo isso porque pouca coisa se aproveita dos links do Comida desta semana. Pelo prisma deles, acaba sendo mais fácil comprar um kit de esferificação na Espanha do que um bom queijo de leite cru nacional.

Anônimo disse...

na minha visão é só o começo, tudo que for "crueldade" mas que não tiver proteção de grandes empresários ou multi-nacionais (aí se encaixa o salmão, frango comum,etc...) por trás é capaz de quererem proibir. se não me engano lá é proibido comercializar carne de cavalo tbm (se bem que essa já teria um tabu cultural). os patos não são alimentados nem mais nem menos do que qlqr frango ou peru de granja. alias, por essa mesma logica a próxima coisa a ser proibida vai ser leitão... (é melhor nem dar ideia!).
em falar em cervejas, acho que o que deveria melhorar é o mercado comum(as mijos de rato gelado do dia a dia...), gosto de cerveja mas é tão prendida na imagem espontânea que não me imagino tomando cervejas de 20 ou 30 reais com frequência (sem contar que tem validade curta, ao contrario dos vinhos)

Anônimo disse...

Sinceramente não entendo porque o vinho, uma cultura já estabelecida, merece mais atenção que a cerveja, uma cultura em pleno desenvolvimento!!!

Postar um comentário