01/11/2012

Leitor de 5ª entre lagostas, eventos e "gastronomia-arte"


Paladar e Comida conseguem fazer, simultaneamente, boas edições semanais. Fato raro. Capas focadas no consumidor - café, no Comida - e na política de pesca (Paladar). Também tem destaque o Salone del Gusto.

Alexandra Forbes discute gastronomia em tempos de crise. Chefs estrelados lançam restaurantes de “linha B”, mais baratos. Quique Dacosta é um deles. Massimo Bottura, outro. É de se compreender que numa Espanha com 25% de desemprego isso tenha se tornado uma necessidade imperiosa. Mas um copo de Lambrusco a 3 euros é muito caro, no meu modesto modo de ver esse vinhozinho. O modelo extremo é Alain Ducasse, mestre da “restauração hexagonal” (sic) segundo o Gaut Millau. Ele possui 26 casas pelo mundo, sendo a 7ª fortuna entre cozinheiros, com um patrimônio de 9,7 milhões de euros. O negócio parece bom, mesmo tendo a crise por pano de fundo. 

Para Forbes, “as melhores experiências à mesa ocorrem quando o dono está ali, regendo a orquestra”, embora registre casos excepcionais. Bocuse brigou com Gaut Millau quando perdeu uma estrela por essa mesma razão: por acaso Giovanni Agnelli ficava na linha de montagem da Ferrari para garantir os melhores carros do mundo? - perguntava o chef indignado com a punição por ter se tornado um globetrotter. Não é discussão fácil.

Forbes assina também reportagem sobre o Salone del Gusto, do Slow Food. Lá estava a troika Mara Salles, Neide Rigo e Ana Soares a propagandear nossas frutas. Essas “disneylândias gastronômicas” (sic) tendem a se multiplicar, graças à tendência ultra-locavorista que se propaga. Sempre, e em toda parte, há o que descobrir e enaltecer. Nem que seja uma ervazinha e um caramujo que o cervo pisa quando pasta. 

Paladar traz maior cobertura sobre o evento, onde a troika apresentou limão-cravo, umbu, jatobá e pequi, além de estarem presentes farinha de copioba, polvilho, baru, licuri, mel de abelha sem ferrão, etc. Cobertura muito superior às parcas linhas que Comida concedeu a Alexandra Forbes. Na mesma linha, a entrevista com Alice Waters, que estará no evento da Prazeres da Mesa, semana que vem.

A importância de eventos como Salone del Gusto cresce à medida que o grande comércio entra nessa onda também. O Carrefour francês, com sua coleção Reflets de France, que já tem 15 anos, anuncia que vai aumentar seus fornecedores da agricultura familiar de 25 mil para 50 mil. Mais singularidades surgirão nas prateleiras dos supermercados, apropriando-se das virtudes do “artesanal”.

Comida, como matéria de capa, presta um bom serviço ao consumidor: das 10 marcas de café mais vendidas em supermercados, quais as melhores em degustações às cegas? Ganhou Origem Brasil, e Santo Grão ficou em segundo lugar, seguido pelo Café do Ponto. Os baristas foram Silvia Magalhães, Caio Alonso Fontes e Gelma Franco. A revista saopaulo do último domingo trouxe o CoffeLab como campeão na categoria Café. Senti falta, portanto, da Raposeira nesse ranking. De qualquer forma, é um bom exemplo de matéria - com potencial grande de contrariar interesses estabelecidos, que é o que o leitor precisa e o jornais titubeiam em entregar.

Josimar Melo resenha um restaurante no Butantã. Cozinha “mediterrânea”, seja lá o que isso significa.  Acho que é preciso conferir, pois é um pouco fora do eixo “jardins” e um tanto não convencional.

O sumiço da lagosta é caso sério, como mostra a capa do Paladar. A sobrepesca acaba com o crustáceo no Ceará. O problema persiste há mais de 40 anos, desde a chamada “guerra da lagosta”, quando o governo brasileiro resolveu peitar pescadores franceses que vinham aprisionar lagostas no litoral cearense. Os franceses, parece, deram um jeito, a julgar pela abundancia de “lagosta” homard nas suas feiras; o Brasil, ainda se debate com o problema da sobrepesca, da pirataria e de acordos pesqueiros lesivos à reprodução da fauna marinha. O Ministério da Pesca parece encantado com a piscicultura e só.



Fico sempre me perguntado o que é essa coisa de “gastronomia e arte”, um parentesco forçado de qualquer maneira, especialmente depois que Adrià participou da Documenta. Careme colocou a confeitaria como dependência da arquitetura. Talvez tivesse razão, pois qual o objeto específico da “gastronomia arte”? O “Picadinho” do Comida entrevista Laurent Suaudeau e Felipe Chaimovich, curadores da mostra “Encontros de Arte e Gastronomia”, que o MAM realiza. 

Confesso que, da leitura, não cheguei a qualquer conclusão, exceto que artistas plásticos e cozinheiros estão fazendo um auê conjunto no MAM. A questão é simples: da associação,  o que é que transcende o aspecto plástico do produto? Por outro lado, agora, além dos chefs, são também os artistas plásticos a respeitar as “leis da Anvisa”, esclarece o curador. Pobre arte! Arte = artesanato. Até ai consigo ir, não mais.


0 comentários:

Postar um comentário