29/04/2013

Brasil três estrelas


Há que se acrescentar algo ao que dissemos um ano atrás. Três restaurantes brasileiros entre os 100 melhores do mundo - sendo 2 entre os primeiros 50 - é um fenomeno que merece alguma atenção. Nós sempre soubemos que eles estão entre os melhores ao alcance, mas que isso seja reconhecido por uma revista que edita um guia mundial é que constitui a verdadeira novidade. Além disso, a forma de escolha é bastante pulverizada, de modo que a diversidade do ranking final é uma meta.
Guias como Zagat, Gault-Millau, Michelin vão, definitivamente, ficando num segundo plano. Michelin, criado em 1900, definiu um modelo de turismo: o turismo gastronômico no território francês. Hoje, edita 27 guias, cobrindo 23 países, reunindo 45.000 endereços. Uma coisa impossível de se conferir.

Muitas coisas que ele fez são bastante discutidas. Por exemplo, deu para Tokio mais estrelas do que para os restaurantes de Paris. Ele se justifica dizendo que Tokio possui 160 mil restaurantes, ao passo que Paris apenas 15 mil. Mas os japoneses acham que os ocidentais não compreendem sua comida como eles mesmos compreendem, dispensando essa comenda estrelada.




Gault-Millau, por sua vez, notabilizou-se por aclamar o advento da nouvelle cuisine, nos anos 1960-70, marca da qual não conseguiu se distanciar. E o Zagat é um guia tipicamente americano, feito por americanos para americanos, mesmo quando indica endereços em outros países.

Já o guia 50 Best conseguiu a proeza de pulverizar as escolhas, mobilizando cerca de 900 jurados no mundo todo, que dizem o que é o melhor onde estão e, também, sugerem alguns “melhores” em lugares mais distantes.

Organizado como uma “Academia”, o júri abarca 26 regiões diferentes, cada uma com 36 especialistas mantidos em segredo, além de um presidente. Os especialistas representam o mainstream gastronômico dos países e regiões. 

Um esforço tão grande, para distribuir o juízo por tantas pessoas e países, só pode resultar num guia mais condizente com o mundo globalizado em que vivemos - e ainda mais “globalizado” quando se trata de uma especialidade como a gastronomia - do que os antigos guias “nacionais” ou “regionais” como Michelin, Gault-Millau ou Zagat.

O que o 50 Best conseguiu, com o patrocínio milionário de empresas transnacionais de alimentação, foi expressar de maneira conveniente (concentrada) o juízo difuso de um mundo sem um claro centro de referencia - critério especialmente importante depois da aposentadoria de Ferran Adrià, que o manteve por bom tempo de forma centrípeta.

Da nossa parte, ninguém, em sã consciência, pode dizer que os três brasileiros, se não são os “melhores” num juízo absoluto, não estejam entre os melhores num juízo comparativo. E talvez sejam os “melhores dos nossos melhores” justamente porque conseguiram visibilidade internacional, angariando também os votos de jurados que não os brasileiros. Em outras palavras, porque também se “globalizaram”.

Isso é particularmente bom para os seus negócios, em especial dada a proximidade da Copa. Mas é bom também para os jovens que tomam esses profissionais como modelos de atuação, pois mostra que o caminho da inovação, da pesquisa, do questionamento dos fundamentos da cozinha brasileira, encontra um mundo interessado em trabalhos que revelem, com clareza, as possibilidades dessas opções modernas.

3 comentários:

Renata Queiroga disse...

Muito bem refletido o texto! Adorei!
Sou estudante de gastronomia e escrevo um blog, o Tempere sua Viagem. Como estou pesquisando sobre o assunto, gostaria de indicações de livros que tratem desse assunto: Guia Michelin, Zagat e/ou Gault Millau. Será que você poderia me ajudar?
Em tempo, adoro o seu blog e sua reflexões, bem como seus livros!

e-BocaLivre disse...

Renata, obrigado. Sobre os guias, consulte o livro de Jean-Pierre Poulain (org.), Dictionnaire des cultures alimentaires, Paris, Puf, 2012.

Renata Queiroga disse...

Obrigada Carlos Alberto pela informação!
Gostaria de convidar-lhe a conhecer o meu blog, o Tempere sua Viagem e de sua opinião sobre ele.
Abraços,
Renata Queiroga

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