25/06/2009

De que critica gastronômica precisamos? – VI

O “negócio restaurante” deve ser objeto de tratamento da crítica gastronômica, ou pertence às páginas de economia dos grandes jornais?
O glamour atual dos chefs se baseia na identificação com o artesanato. O roteiro do chef que dá duro, acorda cedo, vai ao mercado, escolhe o melhor, prepara cada prato com a mesma atenção, observa o prato que sai da cozinha em direção à mesa, fundamenta uma idéia do “cuidar” que o cliente entende merecer e pagar por ele.
Raras são as atividades onde a noção de “preço justo” esteja tão presente. Comer bem e pagar por isso “o que vale” é a consagração do acolhimento que, idealmente, deverá se repetir sempre. É esta forma de representar a relação básica restaurante-cliente que consolida a idéia de que se trata de um artesanato único.
É difícil transcender esse tipo-ideal. Em função disso, muitos chefs que “não estão lá”, à frente do negócio, foram punidos. Esta a razão da birra histórica de Bocuse com a Gault-Millau. A revista zela pelo mito.
Mas cadeias de bistrô, expansão de negócios para outras áreas, entrelaçamentos financeiros são, cada vez mais, dimensões fortes da restauração.
Os negócios de Alain Ducasse montam a € 93 milhões; os de Joel Robuchon, a € 60 milhões; os de Laurent & Jacques Pourcel, a € 37,5 milhões; os de Georges Blanc e Paul Bocuse a, respectivamente, € 22 milhões e € 19 milhões – todos em valores de 2007 e segundo a revista francesa Challenges (nº69, março de 2007).
Nos EUA, os super-chefs de destaque, isto é, aqueles que possuem mais de um restaurante, são Wolfgang Puck, Charlie Palmer, Todd English, Milliken e Feniger, Tom Colicchio. Charlie Palmer se tornou sócio da Microsoft num software de administração de adegas que, inclusive, aumentou em US$ 750 mil suas vendas anuais de vinhos no Aureole de Las Vegas.
Decididamente não se trata apenas de small business. E os problemas não são exclusivamente culinários, haja vista o trágico suicídio de Bernard Loiseau (do qual me ocupei no livro Estrelas no céu da boca).
Os problemas da formação do gosto do público, a manutenção da qualidade homogênea, a globalização, são aspectos do negócio restaurante as big business e eles são presididos pela lógica financeira, não pela lógica das panelas.
Seria ingenuidade imaginar que isso não se reflita nas panelas. Mas também é verdade que, no Aureole de Nova Iorque (foto), comi a melhor sobremesa de chocolate de minha vida...

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