Demorou, mas finalmente saiu o suplemento Paladar da Folha. O Estadão havia tomado a dianteira, em sintonia com um desejo de consumo que se incrementa de forma visível. A Folha, contudo, procura mostrar agora que foi pioneira, criar a sua própria história apesar da “descontinuação” (tentarei incorporar essa palavra ao meu vocabulário, juro; afinal de contas, é correta) do produto em 1992. O mesmo título - Comida - existiu entre 1988 e 1992. “Descontinuou” porque, por longo período, a Folha preferiu a “moda” e seus babados a “esse negócio de comida”, deixando solitários Josimar e Nina Horta, pendurados lá na Ilustrada.
O caderno promete transitar da “alta gastronomia à comida de rua do Brasil e do mundo”. Em outras palavras, ainda não escolheu seu foco, tão vasto é o mundo.
Nessa reestreia, conta com a vantagem da experiência do Estadão, que viu de camarote, podendo oferecer algumas novidades. Por exemplo, alguns colunistas mais pops (Alex Atala, Rodrigo Oliveira e a querida mexicana Lourdes), enquanto o Paladar, herdeiro de outra história, tem que carregar certo ranço nesse particular.
Nina Horta é chamada “colunista festeira” não sei porque. Ela escreve bem, e isso é o que conta. E Josimar parece convocado a produzir mais: resenhar dois restaurantes por semana, um deles com preços acessíveis (e, suponho, outro com preços inacessíveis, nesse país de comida pela hora da morte...). Mas ele já não fazia isso?
Alexandra Forbes “pinçará” tendências da gastronomia pelo mundo. É a tarefa mais difícil, pois se há algo confuso é quais são as tendencias atuais da gastronomia. Mas ela, assim como a historiadora da ciência, dedicada à alimentação - a Cristiana Couto -, o nariz expert em café - Isabela Raposeiras -, e Marcelo Katsuki, tão bem sucedidos em seus respectivos blogs, foram incorporadas à “plataforma on-line” do novo caderno. Talvez para os leitores assíduos desses blogs não haverá grandes diferenças, mas certamente o público será ampliado. A plataforma virtual oferecerá também um “banco de receitas”. Não sei pra que. Vai ter uma cozinha experimental?
Já André Barcinski, o adepto da “culinária ogro”, aparecerá como o paladino da “cozinha sem frescuras” numa coluna que promete ser dissonante (e me pergunto: a frescura será a regra?).
Parece que Jorge Carrara, que estudou vinhos na Argentina, dançou. Patricia Jota, “que estudou vinhos na Europa”, escreverá sobre...vinhos. Mas não será fácil bater o Luis Horta, que, seguindo os ensinamentos do mestre Ascenso Ferreira, estudou vinhos em Minas Gerais, Europa, França e Bahia.
Seja como for, é esperar para ver. Especialmente se somos liberais e acreditamos que a competição faz bem prá cuca e pro bolso. Como dizia o grande filósofo Fernando Collor, “o tempo é o senhor da razão”, embora ambos não o tenham favorecido...
Li duas vezes o “editorial” que saiu ontem na Ilustrada, ou a apresentação do projeto. Não descobri quem irá editar o caderno Comida, e achei muito estranho não proclamarem o seu nome. Mas só nos resta desejar longa vida ao caderno, que, felizmente, venceu, após longos anos, as forças internas da “descontinuação”.
*
Na primeira edição, que saiu hoje, a impressão é que o produto é melhor do que o prometido. Isso é bom. Mas também fica a sensação de que o ecletismo extremado será a marca; o que será bom ou não, dependendo da semana.
Está lá o Alex falando de Ibitipoca. Nada de mais, porém. Um belo depoimento da sempre sedutora Lourdes Hernandes, uma das mais originais cozinheiras de São Paulo. O jornal encontrou uma boa forma de captar as palavras, sem precisar colar a cozinheira no computador a escrever.
A grande matéria, porém, é de auto promoção: a coleção “cozinha da Itália” que a Folha lançará. Somando com os anúncios da Brastemp, da Estácio e do café Pilão, publicidade explícita é o que domina. O que não dá para entender é uma página, onde há a cronica do Barcinski, com desenhos sobre uma cozinha profissional por dentro. É pros estudantes da Estácio recortarem e colar no caderno? Não sabemos.
As melhores matérias são da jovem veterana Luiza Fecarotta. Uma sobre a reabilitação da carne de porco (e só faltou citar que um bom lugar para comer porcheta é a Casa da Li); outra, sobre onde se vende a sucata dos restaurantes que fecham.
Você, leitor assíduo, sentirá falta do Jorge Carrara. A moça que estudou vinhos na Europa nos apresenta uma matéria de estreia que só deve interessar a jovens baladeiros: “porto” rose on the rocks. Eu passo.
Erro mesmo é a matéria sobre ovas de peixe. "Quem precisa do carissimo beluga quando existe por ai uma grande variedade de bolinhas com texturas e sabores bem mais acessíveis?", pergunta a matéria. Kike, aprenda: uma coisa é uma coisa; outra coisa, é outra coisa! Certamente quem acha que tudo se resume a "bolinhas" não precisa de beluga mesmo. Agora, "sabores acessíveis" é a primeira vez que ouço falar. Para dificultar a intelecção, compara-se preços de 50, 55, 56 e 100 grs. Kike Martins da Costa faltou às aulas de aritmética. E a algumas de gastronomia, está claro.
E o Paladar do Estadão, como reagiu a tudo isso? Em compasso de espera, estudando o adversário que entrou pesado no mercado de midia que esse tipo de publicação angaria.
Fez uma capa, metida e engraçadinha, sobre hot dog. Seguida, é claro, daquelas avaliações que sempre deixam a desejar de pães, salsichas, mostarda e katchup. Minhas mostardas prediletas que estão no mercado são a Reine Dijon e a Amora. Nenhuma delas, ambas da Casa Flora, “concorreu”. O pão? Seria o "caseirinho" da Padaria Aracaju. Também não foi avaliado. Serei muito “fora da curva”?
Adorei a matéria de Luiz Horta sobre os vinhos Tondonia, e ver a foto de Maria Jose Lopes de Heredia. Escrevi sobre ela coisa de dois anos atrás. Sobre a sua “estratégia da aranha”.
Janaina Fidalgo nos oferece um apanhado de instrumentos para lidar com o ovo. Só faltou o toc oeuf (que corta uma tampinha no ovo) visto que não há por aqui e pouca gente conhece. Mas seria, de longe, o mais perfeito deles.
12/05/2011
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4 comentários:
Excelente post! (como sempre) Eu sou um dos que vão sentir falta do Jorge Carrara. Ele sabe muito de vinhos e não é mercenário, como outros...
nossa..(muito) mais do mesmo...mesmo formatinho, mesmos temas, alta comida, baixa comida, bla bla bla...Como assim o Jorge Carrara não está? Com todo respeito à "colunista" de vinhos, mas ela é assessora de imprensa de um importadora..ou era, não sei. Enfim, comentei algo que tem a ver com tudo isso ontem (http://alexandracorvo.wordpress.com/2011/05/11/pensando/)...confesso, estou entediada. ale corvo
Dória,
Detalhe: a crítica do Josimar é do Vinarium, mas o título do serviço é do Epice. A pergunta é: pra quem ele deu a estrela?
Abraço
Dória, um dado que você não abordou chamou minha atenção: o caderno da Folha inaugurou com 16 páginas. Na semana passada, o Paladar tinha apenas 6, nesta quinta "evoluiu" para 10. Quantidade nunca é sinônimo de qualidade, mas neste caso, o Comida dá uma lavada no Paladar em quantidade e variedade de informações. Também me pareceu que a Folha veio com uma proposta mais identificada com o público jovem, enquanto o Estadão continua apostando no público mais maduro, inclusive mantendo aquela coluna chamada "Cozinheira de Madame", que eu sempre achei de gosto duvidoso.
Adoro o Barcinski e os textos dele, mas estranhei sua presença no time de colunistas do Comida. Será um colunista fixo? Só porque ele escreveu uma coluna engraçadinha no blog dele sobre comida ogra (parcialmente repetida no texto do Comida), isso o qualifica para uma coluna permanente e semanal no caderno da Folha? Tenho minhas dúvidas.
Vamos esperar a edição da semana que vem para saber se o cardápio fixo do Comida será tão apetitoso quanto este menu degustação bacana que serviram hoje.
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