18/04/2015
O homem que não precisava de deus
Charles Darwin morreu há 133 anos, em 19 de abril de 1882. Ele foi o principal cientista a expor a fundamentação materialista da vida, mostrando que era possível prescindir de qualquer deus na explicação do funcionamento do mundo. Por isso é considerado o expoente da “geração do materialismo” que abarca a produção intelectual europeia entre 1870 e 1900, cujo aspecto marcante é o fato de que os intelectuais nesse período leram e tomaram em conta as descobertas de Darwin, adotando com entusiasmo uma concepção evolutiva do universo, mesmo em seus campos específicos.
Darwin mostrou que, através do mecanismo da seleção natural, a vida se desdobra, geração após geração, há milênios, deixando atrás de si o que chamamos “evolução”. Um mundo que se move sem qualquer finalidade era mesmo uma ideia revolucionária que se contrapunha àquela na qual o mundo, comparado em complexidade ao mecanismo de um relógio, supunha um "supremo relojoeiro", conforme a excelente metáfora do teólogo Willian Paley. Até hoje, na luta infinda entre ciência e fé, busca-se aninhar deus na história e, desde Darwin, sabe-se que não cabe.
Mas Darwin não foi totalmente compreendido à sua época. Quando publicou The descent of man (1871), quase ninguém leu o livro que hoje é considerado “a segunda revolução darwiniana”, por se supor, erradamente, que fosse fruto simplesmente da aplicação do mecanismo da seleção natural aos homens. Ledo engano! O que se tem ali é a demonstração de que o homem desenvolve-se na sua animalidade por conta da seleção natural até chegar a um ponto da evolução onde não se transforma mais para se adaptar ao ambiente; ao contrário, transforma e adapta o ambiente para seus fins. Trata-se de uma verdadeira antropologia onde o antagonismo homem-natureza resolve-se pela cultura.
Uma das formas da transformação cultural da natureza foi a domesticação de plantas e animais, aplicando a eles a seleção artificial, consciente ou inconsciente, de tal sorte que, hoje, é uma quimera falar em espécies “naturais” como vieram ao mundo, pois a quase totalidade daquelas das quais nos servimos é produto do engenho humano. Recentemente comprovou-se que muitas frutas consideradas "selvagens" resumem, nas suas formas modernas, um trabalho secular de seleção por povos ancestrais.
Variation of animals and plants under domestication (1868) é a obra de Darwin que mostra a riqueza e variedade criadas pelo homem e das quais lança mão para satisfazer as várias necessidades, incluindo as alimentares e estéticas.
Como construimos o porco doméstico, o boi, o carneiro, as galinhas, os pombos, os cachorros; ou, ainda, a rosa, a hortência, a margarida - e tudo o mais que tem nome de flor - encontra-se no Variation. Uma leitura obrigatória para cozinheiros, pesquisadores da biodiversidade e outros interessados em compreender a relação homem-natureza para além dos clichês fáceis que expressam mais preconceitos do que conhecimentos verdadeiramente úteis.
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