15/04/2015

Sobre termos culinários que os gringos nunca entenderam


Ontem foi a defesa de tese de Rozane Rodrigues Rebechi, sobre “A tradução da culinária típica brasileira para o inglês”. Integrei a banca por esse tema, mas a tese era um estudo linguístico, utilizando a “linguistica de corpus” e, no geral, sobre isso entendi xongas.

É a segunda tese de que tomo conhecimento, no mesmo Departamento de Letras Modernas da FFLCH da USP. A anterior, de Elisa Duarte Teixeira, era sobre a tradução de gastronomia em geral.

Rozane registra vários casos engraçados de tradução, mesmo em sites oficiais do governo (Ministério da Cultura), em textos como os que se encontra em Aromas, Cores e Sabores do Brasil. Ai você encontra joias como boyfriend in the oven (namorado ao forno), bread with cold (sanduiche de frios) ou, ainda, o cravo-da-india como harpsichord (aquele instrumento musical do “cravo bem temperado” de Bach...). Por isso o propósito de Rozane é fazer um dicionário que auxilie traduções a partir dos termos e frases mais frequentes num conjunto expressivo de livros de receitas brasileiras. Esse dicionário deverá contar com umas 400 entradas mais frequentes nesses livros.

Claro, a discussão sobre o “típico” não é fácil. Está apoiada na ideia de miscigenação de índios, negros e brancos; despreza tipicidades como filé à parmigiana, etc. Além disso, há outras caracteristicas nesse “corpus” que devemos levar em consideração. Por exemplo, quando nos vemos através do olhar estrangeiro, como ao denominarmos castanha-do-pará, oficialmente,  como brazilian nut. Que os gringos assim se refiram à castanha-do-pará é compreensível, mas por que nós? E não esquecemos a luta para transformar, internacionalmente, o rum of Brazil em “cachaça”. São capítulos da diplomacia culinária que a língua registra. Se fossemos além, duma perspectiva diacronica, precisariamos considerar o tempo em que azeite de oliva era designado, nas receitas, “azeite do bom” - quando havia tanto óleo feito de sementes nativas que talvez, hoje, consideremos até melhores.

Mas o que é o feijão tipicamente brasileiro, em termos de receitas, se em cada família há uma receita? E o coentro é típico ou a salsinha? Qual o recorte dessa diferença? E o cominho? E quando se entra nos subprodutos da mandioca e seus tipos, ou nos subprodutos da farinha de milho, a Babel parece se ampliar.

O bacana é que essas dificuldades possam ser esclarecidas à medida em que se tornam conscientes e que vá mesmo se constituindo um corpus linguístico de tradução técnica em culinária - brasileira ou não -, coisa que antes só havia para manuais de máquinas e equipamentos, ou para bulas de remédios  etc. 

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