29/07/2015

A maneira torta de sermos italianos eretos à mesa

Para mim foi bastante surpreendente que o paulistano de mente ajardinada tenha eleito o tiramisu como a sobremesa mais in. Tiramisu (stand me up) é uma coisa que não tem propriamente receita, na medida em que se pode combinar de várias maneiras os seus ingredientes, sendo o principal o queijo mascarpone.

Você mesmo pode fazer em casa o seu queijo mascarpone. Basta misturar um litro de creme de leite com 100 ml de leite, levar ao banho maria entre 80-85ºC, ajuntando 1 grama de cremor tártaro, mexendo, quando estiver quente. Em seguida, deixe por 12 horas num ambiente fresco. Depois, com a colher se faz pequenas porções de 100-150 grs, colocando-as sobre uma gaze e deixando refrigerar a 10ºC por dez horas. Eis o queijo mascarpone, segundo um procedimento tradicional. Claro, se não temos um creme de leite de boa qualidade não teremos um mascarpone de boa qualidade (nem pensar no "de caixinha", viu?).

Mas é possível comer bons tiramisu em São Paulo, desse tipo, feitos nos restaurantes. Contudo o Fasano cobra R$ 53 reais pelo tiramisu; o Parigi R$ 44; o Gero, R$ 42. Por que? Porque o mascarpone é importado, e nessa modalidade custa cerca de R$120 o quilo. São as sobremesas “mais caras” de São Paulo o que, digamos, não tem a menor importância para o comum dos mortais. Gente que tem grana gasta sua grana como bem entende, não é?

Por outro lado, isso revela muita coisa interessante sobre o consumo do paulistano. Da mesma forma que o Fasano é eleito o melhor restaurante de São Paulo pelo “júri popular” da Folha, por gente que jamais pisou no Fasano, diz-se que tiramisu “tem que ser com mascarpone importando”; ou que polenta (e já ouvi isso de muito chefinho e chefete) “tem que ser com fubá importado” (embora os italianos adquiram boa quantidade de milho no Brasil, quando a sua agricultura falha).

O desejo de sermos outros é realmente muito forte na nossa cidade afluente. Nós, descendentes de carcamanos do início do século XX, queremos ascender em termos de “identidade italiana”. Não mais aquela coisa calabresa, siciliana, mas o refinamento milanês; não mais pastiera di grano, mas tiramisu com mascarpone legítimo! (e digamos que o Eataly também cumpre essa função, em escala macro,  diante dos que se sofisticaram ao longo dos anos frequentando o Santa Luzia).

Pobre dessa São Paulo que não se encontra, cuja elite se sente mal vestida na própria pele! Almas carcamanas à milanesa...

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