23/07/2010

Os peixes e os paulistanos

Não adianta. Em São Paulo não se come peixe um milímetro que seja além do quase satisfatório. Sempre falta algo. Prova é que no dia 4 de julho o restaurante Porto Rubaiyat, no Itaim Bibi, fechou. Ele, que foi concebido para ser um templo da culinária marinha. O lugar vai abrigar um novo empreendimento “de luxo” dos Iglesias. Só o luxo dá certo em São Paulo?

Parece que sim, ao menos ele esconde as nossas incompetências. Mas, no caso do peixe, é curioso. Se o nosso peixe não fosse “aceitável” como explicar a profusão e sucesso dos restaurantes japoneses? E por que o Rubaiyat vai tentar de novo emplacar os peixes na zona Sul da cidade?

O descrédito começa na piada corrente na feira: à pergunta “o peixe é fresco?” a resposta invariável e jocosa do peixeiro é “não madame! É só o jeito dele mesmo”. E parece que as falhas técnicas, a falta de cultura culinária, se escondem na suposta deficiência do peixe. Essa piada só faz sentido onde o peixe é maltratado.

E ele, na verdade, é tradicionalmente maltratado na paulicéia. Em primeiro lugar, a ditadura das “chapas”. Onde você lê no cardápio “grelhado” leia-se “chapeado”. O que quer dizer frito como hambúrguer. Em poucos lugares há grelhas para peixes. Grelha é aquela superfície plana e canelada, que deixa passar o calor proveniente do carvão ou da lenha crepitante. Se faz isso com carnes, mas não se permite para o peixe. Peixe sai pouco. Por que, então, desperdiçar espaço esperando o peixe que o cliente não pedirá?

Em segundo lugar, o horror do paulistano ao ponto “rose a l´arrete”, ou mal passado. Peixe tem que ser supercozido, como imaginam que deva ser também a carne de porco.

Em terceiro lugar, o preconceito de classe. Sardinha é para pobre. E outros peixes maravilhosos também: a espada, o porquinho, a anchova, etc, etc. Basta ir às feiras de periferia e à feira do Pacaembu para constatar. Nesta última, só robalos, garoupa, atum, Meca e, claro, salmão, salmão, salmão e salmão!

Contrariamente ao que dizia o Frei Vicente de Salvador no seu livro quinhentista, não vivemos como caranguejos na costa. Ao menos não os paulistanos, que se embrenharam sertão adentro e vivem de costas para o mar. E liquidamos os lambaris, os dourados, as piabas. Restaram-nos os peixes de criadouro. Paulista gosta mesmo é do “pegue e pague”. Não de comer peixe.

Quando levarmos a sério o peixe, a coisa mudará. Veremos que um peixe grelhado com um simples fio de azeite é a maravilha das maravilhas que o mar nos oferece.

1 comentários:

Luciana Betenson disse...

Outro post ótimo! Estávamos comentando sobre isto, meu marido e eu, após voltarmos de Florianópolis, outro lugar onde os restaurantes são caros e bem médios, e o peixe, por incrível que pareça, ruim em quase todos os lugares! Peixe bom só comi mesmo na beira da praia no Nordeste e olhe lá. Uma pena num país como o nosso.

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