
Adolescente, um dos grandes prazeres das férias era pescar nas águas do rio Tietê, em Ibitinga, interior paulista. Entretidos entre piabas, lambaris, cascudos e bagres, nosso sonho era mesmo um dia, quem sabe, conseguir tirar da água um belo exemplar de dourado (Salminus brasiliensis).
O bicho atingia até um metro e lutava como ninguém, segundo relato dos pescadores “profissionais”. E era mesmo uma maravilha vê-lo saltar fora d´água no final da tarde – especialmente quando um raio de sol refletia em suas escamas amareladas, iluminando ainda mais o nosso desejo.
Adulto, me interessava pelo seu sabor propriamente dito. Uma carne branca e delicada, apesar da profusão de espinhos. Até que um dia, inspirado pela constatação de que pertencia à mesma família do salmão, resolvi fazer um gravlax de dourado. Depois de pacientemente retirar os espinhos com uma pinça, consegui prepará-lo convenientemente.
Com as comportas nos rios de corredeiras o dourado rareou. Mesmo assim às vezes é encontrável no Mercado Central de São Paulo.
Não entendo por que os peixes de rio são tão desprezados na nossa culinária. A fartura é imensa. Comprei um livro da Embrapa sobre Peixes do Pantanal - de onde tirei essa ilustração. São 269 espécies. Certamente muitas de excelente qualidade gastronômica. Como o lambari.
É muito desanimador constatar que o lambari não é comercializado por falta de licença do SIF. Mais uma vítima da burocracia estatal, como o queijo, o mel, etc.
Países europeus e americanos souberam manter na sua culinária nacional a experiências dos povos indígenas e dos colonizadores com os peixes de rio. Pensemos na truta, no salmão. Nós, ao contrário, nos entregamos aos peixes estrangeiros de rio: a mesma truta, o mesmo salmão, as tilápias, todos cultivados como frangos d´água. Comemos mal para sermos como os povos cujo estilo de vida invejamos.
É hora dos chefs que começam a se preocupar com ingredientes brasileiros se voltarem para os rios e para a culinária de beira-rio, uma vertente que foi tão importante no país até meados do século passado. Basta folhear uma revista como a extinta Caça & Pesca dos anos 1960 para constatar a profusão de receitas de beira-rio.
Retomar os peixes de rio e seu receituário é, sem dúvida, um caminho de renovação da culinária brasileira.
1 comentários:
Uma correção , o dourado é de familia diversa do salmão (familia Salmonidae ). O dourado pertence a família Characidae, bem diversa e distinta do salmão.
O dourado pertence a mesma família do Lambari e é uma das famílias mais numerosas em espécies do Brasil, vulgarmente chamadas de piquiras e muito consumidas das mais diversas formas no Brasil.
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