01/11/2010

Elogio dos cajus



O caju é dessas frutas que se mostraram para a civilização ocidental quando da descoberta das Américas, causando profundo impacto nos cronistas coloniais. Gabriel Soares de Souza (Tratado Descritivo do Brasil em 1587) assim a descreveu:

“Estas árvores são como figueiras grandes, tem a casca da mesma cor, e a madeira branca e mole como figueira, cujas folhas são da feição da cidreira e mais macias. As folhas dos olhos novos são vermelhas, muito brandas e frescas, a flor é como a do sabugueiro, de bom cheiro, mas muito breve (...) algumas árvores dão fruto vermelho e comprido, outros o dão da mesma cor e redondo. Há outra casta que dá o fruto da mesma feição, mas a partes vermelho e noutras de cor almecegada (...). A natureza destes cajus é fria, e são medicinais para doentes de febres, e para quem tem fastio, os quais fazem bom estômago e muitas pessoas lhes tomam o sumo pelas manhãs em jejum, para conservação do estomago, e fazem bom bafo a quem os come pela manhã, e por mais que se coma deles não fazem mal a nenhuma hora do dia, e são de tal digestão que em dois credos se esmoem.
Os cajus silvestres travam junto do olho que se lhes bota fora, mas os que se criam nas roças e nos quintais comem-se todos sem terem que lançar fora por não travarem (...). É para notar que no olho deste pomo tão formoso cria a natureza outra fruta, parda, a que chamamos castanha, que é da feição e tamanho de um rim de cabrito, a qual castanha tem a casca muito dura e de natureza quentíssima e o miolo que tem dentro; deita essa casca um óleo tão forte que aonde toca na carne faz empôla, o qual óleo é da cor de azeite, e tem o cheiro mui forte. Tem esta castanha o miolo branco, tamanho como o de uma amêndoa grande, a qual é muito saborosa, e quer arremedar no sabor aos pinhões, mas é de muita vantagem (...). Estas árvores se dão em areia e terra fracas, e se as cortam tornam logo a rebentar, o que fazem poucas árvores nestas partes”
.

O fruto e o pseudofruto são tão ricos em utilização que bem poderiam ser tomados como o verdadeiro “fruto do paraíso”. Sua importância na alimentação sertaneja é enorme. Come-se o pseudofruto de várias maneiras: ao natural, em compotas; secos em “ameixa”; o suco de duas formas – com e sem a polpa - o “mel”; em “marmelada”; como sorvete; como "cajuina" (suco sem a polpa e clarificado), etc. O fruto (castanha), também é uma iguaria mundialmente apreciada. A criatividade não tem limites diante de algo tão versátil.

E uma iguaria especial é uma espécie de caju conhecida como cajuzinho-do-cerrado, cajuí ou cajueiro-do-campo (Anacardium humile). In natura, essa fruta é quase intragável, por ser muito ácida, apenas doce quando bem madura; mas apresenta o tanino em menor quantidade. É especialmente boa para compotas, quando se revela superior ao caju comum.

Poucos, porém, se dedicam à elaboração dessas compotas tão deliciosas, como é o caso da Lili Doces- fábrica artesanal localizada em Ipiranga, no interior do Piaui.

Existindo especialmente em estado silvestre, o cajui, o “caju de índio”, precisa ser descoberto urgentemente pelos chefs de cozinha Brasil afora. É inconcebível estancarem maravilhados, paralizados, logo na primeira forma do caju com que topam.

1 comentários:

Ricardo Neves Gonzalez disse...

Brasil, país tropical de frutas mil...adorável Brasil!
Creio que nós todos devemos sim, prestigiar estas frutas e lutar para preservá-las. Temos ouro, ouro mesmo em quintais e pomares nossos.
Em Minas Gerais existe uma pequena fábrica que produz o melhor doce de fruta que já experimentei. Chama-se Doce da Lata, uma pequeníssima produção artesanal de goiabada e que junto a ela produz-se uma mangada maravilhosa, com uma cor, uma textura e um sabor incomparáveis. Existe inclusive no movimento Slow Food o programa Arca do Gosto que identifica e protege especialidades gastronômicas que podem estar ameaçadas de extinção. Indiquei esta mangada como produto que merece um estudo e proteção por parte da Arca do Gosto.
MARAVILHOSO este doce....
www.docedalata.com.br

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