11/02/2011

Reação thermidoriana em gastronomia

Muita gente anda saindo do armário para dizer que está cansada de gastronomia ou de “gastronomia de vanguarda”. Não é para menos. Já se espumou muito pelos quatro cantos da Terra e esse negócio enjoa. Principalmente porque, ao se generalizar, perde o caráter de novidade, o poder de surpreender que Adrià acha fundamental na gastronomia presente.

Esse é o problema das ondas baseadas na inovação técnica: elas se difundem, se banalizam e perdem o poder de galvanizar o entusiasmo. Muito bem, e depois? Há os que esperam o novo passo de Adrià e há os que querem interpretar as “tendências” correntes sem Adrià.

Depois da revolução vem a reação thermidoriana. Robespierre foi guilhotinado na sua própria invenção. Os “conservadores” retomam a ofensiva, reafirmam o triunfo do “velho” sobre o novo e dizem “agora vai”. É assim com a gastronomia baseada no terroir, na tradição das avós; é assim com o confort food etc. Gente que, não se sabe bem porque nem para que, se tornou defensora militante do leite condensado, da nutella, do brigadeiro e assim por diante. Mas...será assim mesmo?


A verdade é que nesse movimento de reação não há novidade (a não ser nominal). Mas isso não engana os novidadeiros autênticos, que sempre esperam por algo tão sensacional quanto o ciclo das espumas espanholas. Mas eles deveriam se dedicar a pesquisar o que encheu mesmo a paciência dos consumidores que, talvez pela primeira vez, começaram a se acercar da gastronomia.

Pessoalmente me enchi da estética dos pratos. Aquela coisa que basta observar uma fotografia para ver: uma pirâmide que se erige no meio do prato, cercado por um riachinho de molho ou redução. Me enchi das texturas, quase sempre muito aproximadas, exceção aberta para as texturas das carnes à baixa temperatura.

Me enchi do ritual de declamação do que vai no prato – sendo que quase nunca o garçom consegue ser exato. E me enchi dos preços demasiado altos, que se apoiam na idéia de “alta gastronomia” que, parece, constituiu um mercado a parte. Se a “alta gastronomia” já não dá tanto prazer, ela será puxada, inexoravelmente, para o terreno da comparação dos preços. Perderá a condição de “preço de monopólio”.

Não me enchi, e jamais me encherei, da verdadeira criatividade, com ou sem apoio em técnicas modernas. Mas é preciso reconhecer que ela se torna mais difícil quando o primado da técnica se desfaz, graças à sua própria universalização. Assim, persisto na esperança de coisas insólitas, criadas, por exemplo, a partir de alguns ingredientes difíceis , como pequi, ou ou iquiriba. Essa linha de inovação não depende dos adjetivos que definem “tendências” ou “alta gastronomia”. De fato, à mesa, pouco importa a filiação politico-estética do chef. É sempre possível cozinhar bem...

2 comentários:

com meus botoes disse...

Da mesma forma que algumas vezes me irrito com o ar levemente pedante de alguns de seus posts, eu tambem os adoro!
Com todo respeito e sem 2as ou 3as intenções que não a de elogiar o que é bem dito.
Abraços

Claudia disse...

Ah Dória, você não está sozinho..

A adorei o tal "ciclo das espumas espanholas"... para ser honesta ri muito com o texto todo. Mas você tem toda razão. O que é um pouco triste é constatar que o Adriá, em cujas mesas alguns poucos puderam sentar para comer, leva toda a culpa pela epidemia das invencionices. Ele não merecia o bode todo...

Claudia

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