10/03/2011

Leitor de quinta: o que vale um restaurante (II)

Na citada matéria da Folha há um pequeno texto de Josimar onde ele lembra que “é bacana abrir um negócio por paixão. O problema é quando a pessoa esquece que é um negócio, que ali não será a acolhedora sala de jantar de sua casa, mas, sim, uma empresa complicadíssima, com todos os problemas de qualquer empreendimento”. É super verdade. Tanto que o clássico livro Chef Profissional, do CIA, que o Senac editou, mais se preocupa com a formação do pequeno empreendedor do que com o chef que ele porta dentro do dólmã.

De fato, dinheiro não aguenta desaforo, dizem os financistas. O capital aplicado em qualquer atividade produtiva ou comercial deve render, no Brasil de hoje, mais do que a taxa Selic de 11,75%. Não é fácil. Mas a rentabilidade média do setor de restaurantes diferenciados em São Paulo, nos dias de hoje, situa-se entre 17-20% líquidos (o que é diferente do EBITDA). Trata-se de uma boa aplicação, quando se consegue rentabiliza-lo; um péssimo negócio quando, por erro de projeto ou gestão, ele se encaminha para a morte prematuramente, como sugerem os dados disponibilizados na matéria pela Abrasel.

Há duas maneiras de calcular o valor de um restaurante, usualmente aceitas pelo mercado. Uma é o cálculo do EBITDA (earnings before interest, taxes, depreciation and amortization, ou seja, os lucros antes dos juros, impostos, depreciação e amortizações). É ele que os bancos olham e, por decorrência, os investidores. Esse cálculo determina a saúde de um negócio capitalista. Ele expressa o retorno do capital investido e deve ser superior à taxa de mercado para simples aplicações financeiras. Esta a razão pela qual um capitalista aplica seu dinheiro numa atividade de transformação ou serviço, em vez de deixa-lo sob a guarda de bancos, remunerando-se à taxa Selic. Vamos analisar algumas hipóteses.

O EBITDA expressa o resultado da operação, isto é, receitas menos despesas, antes dos tais juros, depreciação, amortização. Um erro comum é se confundir esse valor com lucro. O lucro é o que sobra depois dos descontos de juros, taxas, amortização, depreciação. E o lucro é que deve ser considerado o rendimento do capital, retornando o investimento na taxa esperada pelo mercado. Para simplificar, os financistas multiplicam o EBTIDA por um número que pode variar, segundo o “aquecimento” ou “esfriamento” do mercado. O que quer dizer que um empreendimento vale um valor variável, segundo o mercado. Digamos que este multiplicador seja 5 ou 6 vezes. Então, um EBTIDA de R$ 60 mil nos diz que o restaurante vale R$ 300 mil a vista. E estamos conversados.

Já o método português-de-padaria é apurando multiplicando-se simplesmente o faturamento médio mensal do restaurante por um coeficiente que também varia segundo o mercado. Digamos que o restaurante fature R$ 90 mil e esse multiplicador seja 5. Então o português-de-padaria estaria disposto a pagar R$ 450 mil. Claro, em 10 ou mais prestações. Os métodos são diferentes, os resultados parecem diferentes mas, se pensarmos o custo do dinheiro e os prazos, veremos que são bem assemelhados. Ao menos é o que acontece quando comparamos um grande número de casos, adotando o método canônico de cálculo do EBITDA e o calculo simples, baseado na multiplicação do faturamento médio. Sabedoria de padeiro....

Assim, multiplicando o que deve faturar por mês, e se conseguir safar 20% do faturamento, o Le Jazz, retorna seu capital em 2,9 anos. Pelo calculo de padeiro, contudo, o restaurante vale, hipoteticamente, R$ 1.560 mil. O Dois, que possui 1.100 clientes por mês, e que tem um ticket médio de R$ 100, valeria, pelo mesmo método, R$ 660 mil.

Esses cálculos não são verdades absolutas. Pelo público declarado, o investidor capitalista achará muito melhor colocar seu dinheiro no Le Jazz do que nas demais oportunidades. Por que? Porque um aspecto importante na determinação do valor é o chamado “calculo da perpetuidade”, isto é, o potencial futuro de lucratividade do empreendimento num horizonte de tempo longo. Assim, o Le Jazz parece garantir um fluxo futuro maior do que os demais, ou seja, ele “vale” mais.

Capitalistas são gente estranha. Bem lembra Josimar Melo que muito playboyzinho se dispõe a abrir casas noturnas já pensando no seu fim. Jogam alto, cobram preços absurdos, enfiam o dinheiro no bolso e fecham a casa. Ou, como diz o proprietário do Pink Elephant, fechado: “a marca perdeu sua força. Queremos investir em algo novo e atrair clientes do mesmo nível”. Ele fala da classe AAA, top-top-top, +++! Essa gente pode ganhar dinheiro. Mas também pode perder e a razão para fazer isso seria o status social que dá ser dono de restaurante ou casa noturna.

Há também gente que não é do ramo, nem quer se estabelecer nele: montam uma “operação” para “lavar” ou “esquentar” dinheiro de “caixa 2” e ponto. Todo tipo de comércio de varejo, com grande público, se presta a essa operação. Parecem que estão no ramo de alimentação mas não estão e, portanto, não são um problema que mereça o tipo de atenção que queremos dar. Apenas canibalizam o mercado por pouco tempo para realizarem o seu outro objetivo. Ninguém fala sobre eles, e é melhor assim.

Bem, vamos concluir esse assunto no próximo post do leitor de 5ª!

(segue)

1 comentários:

Rubens Ghidini disse...

Ansioso pela continuidade, pois, pelo andar da carruagem, tarefa insana é manter um restaurante...

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