Seguindo pelo caminho infinito dos ingredientes, a capa do Comida é o quiabo, em boa matéria de Juliana Saad. Só uma coisa me incomoda: a ideia de que o quiabo virou “cult”. De repente, algo que sempre esteve ai, na tradição popular, parece que passa a existir só porque uns chefs resolveram olhar para ele. É que os jornais não conseguem fazer matéria sobre coisas corriqueiras, exagerando no aspecto novidadeiro.
Tenho certeza de que tudo o que se faça como “novidade” com o quiabo nem arranha sua plácida existência centenária. O que há é um subdesenvolvimento gastronômico, que não sabe tirar dos ingredientes tudo o que eles podem dar, justamente por falta de pesquisa. E quando surge uma Roberta Sudbrack é mesmo um fenômeno. O que mesmo fazem com o magnífico pequi, além do goianamente estabelecido? Gostaria de vê-lo na capa de Comida.
Houve um certo engano técnico num lead da matéria. Não há que “tirar a baba” do quiabo antes de fritar, pois a própria fritura liquida com ela. Aliás, acho que quem não suporta a baba do quiabo deveria comer outra coisa. O jiló, por exemplo. Ou jatobá. Já falei aqui da baba.
Talvez Comida tenha desperdiçado uma ótima capa, com a matéria sobre Juliana Paes, protagonista da neo-Gabriela (a novela). Vem ai o centenário de Jorge Amado, que bem mereceria um estudo sobre como, em sua obra, se apropria da culinária de santo recolhida por Manoel Querino. Isso que dá se atrelar ao horário nobre de novelas...
Boa matéria de Fabio Brisolla sobre o “império Troisgros” no Rio. Hoje, com 5 negócios diferentes, Claude surfa na onda que começa com a Rio+20 e só terminará daqui uns 4 anos. Bom tempo para consolidar um sólido grupo econômico baseado na culinária, desde que tenha boa gestão de negócios. No Paladar, reportagem sobre A quinta do marquês - quem anda pela Castelo Branco pode parar no quilometro 57 para comer pastéis de belém “de verdade”, além de leitoa pururuca “da bairrada”.
Josimar dá notícia de um restaurante - Peixaria - que, por influência espanhola, parece manipular bem os peixes que são expostos e comprados a quilo. Paladar anuncia a abertura da casa de Flávio Miyamura - aquele rapaz que secundava Atala em programa de TV e que levou nas costas a cozinha do Eñe na ausência dos gemeos espanhóis. Simpatizo com ele. Agora vamos ver a sua cozinha. E Luiz Américo sugere que experimentemos o “restaurante islâmico” Maramiah, onde se pode tomar cerveja!
Alexandra Corvo continua sua andança com os vinhos a tiracolo: foi à praia, agora vai à montanha. Essa forma de relacionar o vinho com o território é diferente daquela de se considerar o terroir como determinante. Agora, fala do prazer de se consumir o vinho em diferentes latitudes. Já Luiz Horta está na capa do Paladar, falando da reforma dos vinhos de Bordeaux. Querem ser mais fáceis e baratos, surfando nas modas atuais. O terroir busca outra expressão, talvez para descer montanha e subir floresta a tiracolo da Corvo.
Nina Horta: “no Brasil todos os bolinhos são melhores do que scones, que não tem gosto de nada, só ficam gostosos com manteiga e geléia”. Eu pergunto: o que seria da maravilhosa geléia de laranjas de Sevilha se não fossem os scones? Só sobre eles podem reluzir convenientemente. Mas não é exatamente este o tema da cronica, que vale ler.
21/06/2012
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4 comentários:
Interessante notar como o quiabo do jornal é nobre quando acompanhado de foie-gras, quando a semente é apresentada como "caviar" ou quando faz parte de uma "ratatouille". É quase como se existisse uma vergonha no quiabo.
Caviar de quiabo vale mais que semente de quiabo.
Bem observado, Gilberto.
Gilberto e Carlos, é engraçado e um tanto decadente como voltamos aos velhos habitos. Na epoca em que Claude e a nouvelle cuisine chegaram por essas terras a população só queria saber de pratos franceses e até mesmo comiam pratos brasileiros desde que tivessem nomes franceses. Outrora estive reparando como abandonamos esse habito mas adquirimos o tal "gourmet". É cajuzinho gourmet, brigadeiro gourmet, tapioca gourmet, pamonha gourmet. O que todos sabemos que não mudou absolutamente nada, continua sendo a pamonha, a tapioca, o brigadeiro normal. Só que posso por gourmet e cobrar 10 reais mais caro. Estamos regredindo no modo de nomear nossos pratos, será que o nosso portugues não é tão complexo que precisamos "francesear" novamente nossa comida?
A bem da verdade, o desejo de comer à francesa é bem anterior à nouvelle cuisine.
A inovação gastronômica não é fácil. Daí a tentação de se concentrar os esforços no plano da nominação das coisas. Coisas comezinhas viram "gourmet" por falta de recursos realmente inovadores.
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