23/04/2010

Leituras de bordo

Há dias nos quais você quer descansar e resolve passar os olhos por todas as publicações sobre gastronomia que tem em mãos. As leituras de bordo da nau culinária. Menu, Gosto e Prazeres da mesa de abril.

A capa da Menu complica o picadinho. Reduz uma tradição a um gesto: picar não importa o que. Daí, é claro, os picadinhos se multiplicam. Mas o que impressiona mesmo é que quem faz a revista é Suzana Barelli. Bem que merece um aumento salarial! Há cinco textos assinados por ela, inclusive um relato de bom jornalismo, da viagem ao Vale dos Vinhedos que nos informa que de lá não sairá nada semelhante a vinho nesse ano, graças às chuvas. O resultado é que as uvas irão servir para decuplicar a produção de espumantes. Vamos torcer para que os enochatos se dêem conta disso.

Pontos baixos: a matéria sobre “ingredientes amazônicos” que não sai dos limites do restaurante Banzeiro, em Manaus. Podia muito bem ter passado pelo Ver-o-peso e pelo Remanso do Peixe, em Belém. E também a matéria sobre gastronomia em alto-mar. Parece informe publicitário da linha Crystal Cruises. OK, mas podia nos avisar se é.

Prazeres da mesa traz boa matéria sobre Benny Novak, esse eclético cozinheiro-empresário. Mostra como, através de terceiros, consegue “estar” onde não está, garantindo a qualidade que promete daquilo que entrega. É um modelo de negócios interessante. Faz também um bom roteiro de Brasília, cidade na qual a gente nunca sabe onde ir à noite.

Achei uma bobagem a matéria sobre o desafio de cozinhar "sem nenhum tipo de energia". O que é isso? A energia corpórea não é energia na Prazeres? E colocam como selo da matéria "especial Sustentabilidade". Bah! As virtudes dos pratos executados por Roberta Sudbrack e Yann Corderon não são as apontadas. São outras e melhores! E a sustentabilidade, convenhamos, é outra coisa! Parece faltar idéias propriamente culinárias nas reuniões de pauta... assim como conceitos de sustentabilidade.

O difícil mesmo é um informe publicitário nas páginas 104-105. Gente, o que é aquilo??? Há um esforço gráfico da revista que se põe a perder por uns trocadinhos e pela vaidade de um certo Ronaldo Varela. Não pode! Ou melhor, não deveria!!!

A Gosto melhorou bastante, não é mesmo? Graficamente avançou bastante. E quer ser popular, tratando do Polpettone. Mas cobrando R$ 11,90 é difícil. Melhor ficaria essa matéria em Claudia Cozinha. Mas o que me criou um certo mal estar foi a matéria de capa, sobre o tiramisú, coisa à qual Dias Lopes também dedica o seu editorial. Tá tudo bem explicadinho por Roberto Ravióli, em texto na primeira pessoa. Mas não pega bem fazer isso num número que traz estampado anúncio de página inteira do Empório Ravióli, do mesmo mestre-cuca.

O impressionante mesmo é a presença maciça dos anúncios de vinhos em todas elas. A bonificação que os importadores recebem das vinícolas dá nisso. A desova de anúncios nas revistas, tornando inclusive o material editorial desequilibrado. Muita harmonização. Demais da conta. Parece que o vinho é o principal da vida.

E li também o Guia da Folha da semana passada. Interessante a sensibilidade de Marilia Miragaia para os chineses da Liberdade. Fala da reforma do Chi Fu e fala do Jardim Meio Hectare. O destaque não é para as comidas exóticas, mas para a incomunicabilidade do cardápio.

Acho que já é hora de alguém fazer um esforço para passar os chineses a limpo. Se é difícil penetrar nesse universo, por que não pedir socorro a uns chineses que possam fazer a ponte com a nossa curiosidade gastronômica? Um roteiro do que é bom, prato a prato, é o que estamos a necessitar dos guias.

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