20/06/2010

Recorrido gastronômico por Paris - I

É sempre bom visitar Paris de tempos em tempos. Não porque a cidade mude muito, mas porque o olhar cambiante sobre a velha capital do século XIX tende a mostrar de novo modo o que sempre esteve lá. As bicicletas públicas, por exemplo, podem ser vistas como um novo adorno do transporte que procura materializar a ideologia de que é possível poupar atmosfera em meio ao turbilhão da metrópole. A onda “bio” na alimentação que nos dá a impressão de que rompemos a barreira da poluição de comer, em direção a um mundo melhor, e assim por diante. Não é preciso ser muito arguto para perceber o quanto de enganador há nisso tudo, mas o que importa é a extraordinária capacidade de Paris se apresentar, em meio a tanta tradição, como parteira do modo de vida futuro.

Pessoalmente estava interessado no “bistroismo”, de tanto o que se fala nisso aqui. E ai começam as dificuldades para ver o que São Tomé disse que está lá. Bistrôs por todos os lados, a cada esquina, não parecem viver uma onda de renovação. Pelo contrário: na medida em que se tornam mais e mais objetos turísticos parecem só apostar na tradição. Em qualquer um deles você come praticamente a mesma coisa, com pequenas variações que não indicam um movimento de renovação. A concorrência é acirrada, e os preços são homogêneos por áreas da cidade. Por isso, o que parece contar mesmo é ostentar à porta o selo: “Zagat Rated” – hoje em maior destaque do que Gault-Millau. Esse guia populista norte-americano dá uma segurança danada aos turistas.

Em Saint Germain o menu compris é ofertado por algo em torno de € 24/28, em bairros menos turísticos, o mesmo menu poderá ser encontrado a € 14/18. O seu confit de canard também será muito assemelhado, variando a qualidade da preparação das batatas, ou mesmo ostentando um “brinde”, como moelas de pato confitadas que acompanham a coxa. E a primeira constatação terrível (e que não é novidade para nós): hoje se come mais barato em Paris do que em São Paulo.

Mas ao ir atrás da inovação, vamos a endereços precisos. Au Bon Acueil ; Chez L'Ami Jean, para conferir o que se passa nos tradicionais. Ou aos modernos para confirmar os novos ventos :Violon D'Ingres, Ze Kitchen Galerie ; L´Astrace ; o tailandes Thiou ; Le Villaret. Senti falta dos Bichos, do Alhos e do Luiz Américo para resenharem isso tudo com graça.

O problema de Paris é ser gastronomicamente enorme! Durante os dias 07 e 13 de junho ocorreu por lá a primeira “restaurant week” francesa, com milhares de restaurantes aderentes. Mesmo assim, não se sentia traço dessa iniciativa onde se andava, e os preços da “restaurant week” – na faixa dos € 20,10 - não fazia mesmo muita diferença. Ou fazia: o Le Monde não deixou de registar a situação paradoxal onde o charmoso bistrô La Véraison, cujo menu era a € 15,80 no almoço, teve que aumentá-lo para participar da iniciativa. Ao menos, honestamente, acrescentou homard no menu.

Mas deixe-me dizer que comi muito bem no Le Villaret (13,rue Ternaux, metrô Parmentier). O menu do dia era oferecido a € 25. Um lugar “off Broadway”, simpático, decoração moderna e com coisas “antigas” que muito aprecio: toalhas e guardanapos de algodão, em contraste com os odiosos guardanapos de papel que se generalizaram nos bistrôs.


Uma casa pequena e movimentada. Ninguém ali tem cara de turista deambulador. Todo mundo parece estar apostando no certo. Duas garçonetes com cara de intelectuais sartreanas serpenteiam entre as mesas, levando pratos, servindo vinhos e água.

Escolhi de entrada a terrine d´abats de pigeon, acompanhado por uma taça de corbière e uma garrafa de água. De principal, les fillets de rougets et petit salé poêlé, échalote confits, jeunes carottes – e la se foram mais duas taças de vinho, agora do excelente savennières. De sobremesa, le clafoutis tiêde de ruibarbe. Tudo muito satisfatório, uma refeição memorável, pela qual paguei exatos € 48 com grande satisfação.


A terrine de pombo estava excelente, com umas cebolas confitadas ao vinho tinto e salada. Delicadeza ímpar, aromatizada à perfeição. Dava vontade de pedir mais. Os rougets são o peixe da estação e, como sugere a boa prática, são oferecidos em vários restaurantes. Estes estavam naquele ponto que horroriza os brasileiros desavisados: rose a l´arret ou aquela cara de “cru” que só se admite em sushi. A combinação com a pancheta grelhada e o doce das cenouras era de tirar o chapéu.


Mas os comi também no Le Duc, já no ponto mais tradicional e de fácil aceitação. Incrível é que temos este peixe (chamado entre nós de “trilha”), a preços razoabilíssimos, mas os donos de restaurantes insistem na facilidade das tilápias sem sequer olhar para eles.

2 comentários:

Martim Pelisson disse...

Caro Dória,

Estive aí no ano passado e comi no L'Avant Gout, no 13, um bairro pouco turístico, mas com boas opções. Me pareceu um bistrô que tenta inovar. Se ainda estiver na cidade luz, tente algo por lá. Vale a visita.

http://www.lavantgout.com/

Abs

Laura Peixoto disse...

Nas "catacumbas" do Louvre, tem um bistrô interessante. Ou tinha. Acho q vale a visita.

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