21/07/2011

Leitor de 5ª - mula, esse animal híbrido

Há quintas-feiras gordas, como há magras. Como hoje. Paladar, para fazer render o tema da capa - confit - precisa desbasta-lo, quase escondendo que a palavra quer dizer “conserva”.

Fixa-se na conserva em banha. E mal informa o leitor onde pode comprar banha. Remete-o ao Mercado Central (rua E, box 16), um mocó. Mas em qualquer supermercado você acha banha de porco em blocos de um quilo.

E informa mal: diz que um certo individuo é dos poucos criadores “de pato da raça moulard”. Simplesmente não existe essa “raça”. Moulard é palavras que se refere, em bom português, a “mula” e “mula” é estéril. Se obtém as “mulas” cruzando duas linhagens distintas. Em geral o marreco de Pequim e o pato “barbarie”, que é o pato americano; em geral por inseminação artificial. E ai está a graça da coisa, o resultado que não se obteria de outra maneira. São animais mais apropriados para a produção do foie gras e das coxas e peitos apreciados na gastronomia.

De leve, a matéria dos confits confronta as opiniões de Nathan Myhrvold e Hervé This sobre a questão: o confit traz ganhos de maciez da carne? Ciência emenda a resenha de Olivia Fraga do livro de Harold MacGee, vulgarizador da ciência na cozinha, como Hervé This faz. E ele repetirá algumas “teses” que conhecemos através dos livros posteriores de Hervé, como a que nos diz que de nada vale “selar” a carne. Dinastia de livros sempre bem vinda em terreno no qual impera o empirismo cego, errático.

Melhor mesmo as poucas linhas poéticas com que Luiz Horta inicia sua matéria sobre um restaurante-enoteca em Buenos Aires. Pois inicia pela cor do céu de Buenos Aires, talvez parodiando Mario de Andrade sobre o céu de abril que sempre custa a voltar.

Comida é um desânimo só. Os políticos que, em Brasilia, vão para a cozinha. Fala sério? Pode? E tem também receitinhas de Carolina Ferraz. Estou esperando as de Hebe Camargo, juro. A capa?: por que os restaurantes brasileiros no exterior são ruins? Não prestam em Londres, em Madri, em Paris, em Berlim, em Los Angeles. Bastaria a foto da mulata requebrando entre as mesas em Berlim; diante dela, todo o texto é dispensável. Poderiam ocupar o espaço com outra coisa.

Mas o texto daquela menina que substituiu Jorge Carrara é imperdível hoje: comenta o convite do “Festival do vinho autêntico” português que um amigo enviou para ela. Coisa sem pé nem cabeça.

Nina Horta continua com a saga das empregadas. E sob o seu texto, na mesma página, uma reportagem de Juliana Cunha sobre bufê de casamento. Não fala do excelente bufê de Nina Horta, o Ginger. É isso que a Folha considera isenção, ou só ter “rabo preso com o leitor”: ficamos, talvez, senão com o melhor, sem parte desse “melhor”.

Definitivamente os jornais não estão na sua melhor quinta-feira. Ou não estou eu, o que dá na mesma, em termos práticos, para o blog. Então, vamos parar por aqui para não envenenar o dia do leitor tão gentil que nos seguiu até esse ponto.

3 comentários:

Aristoteles disse...

Excelente análise dos cadernos gastronômicos, como de costume. Pelo que observo, o Paladar tenta fazer matérias mais analíticas e, por vezes, falta-lhe "estofo" para tanto. Ainda assim, aprecio essas matérias - e sempre depois corro para cá para me surpreender com as imprecisões do Estadão.

O Comida segue sem nenhuma pretensão séria. Fica a impressão de que eles preenchem a pauta com qualquer coisa disponível, usando até matérias risíveis como essa dos políticos. Não é um suplemento gastronômico, é um amontoado de factóides.

José Luiz disse...

Tenho a impressão que o Comida é um mero cabide para a publicidade que ele veicula. As matérias pouco ou nada importam.

Anônimo disse...

Realmente, Aristoteles. o Comida pode ser qualquer coisa, menos caderno de gastronomia.

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