A editora Senac dos bons tempos publicou Chef Profissional. O livro, feito segundo o cânone americano, é uma porrada nas fantasias dos candidatos a chef. Nele, o chef é basicamente uma “pessoa de negócios”. Deve ter conhecimentos up to date como executivo, administrador, gerente. Essas coisas serão as mais exigidas, o que não quer dizer que “sua habilidade de grelhar, saltear ou assar os alimentos se torna menos importante”, diz o livro.
Quando o Senhor Bruno Ventre vem a público dizer que Alberto Landgraf “é ótimo cozinheiro, mas não tem capacidade de gestão. Ele faliu o restaurante” nos dá a impressão de estarmos em Miami, não em Copacabana nem Paris.
Sim, porque nós somos de cultura mais européia em matéria de pequenos negócios. O bistrô é tocado, em geral, por um casal: o homem na cozinha, a mulher no salão e na administração. Nossa cultura europeizada, porém, tem algo de inadaptado para o ambiente de negócios no Brasil. Os executivos formados em qualquer escola olham os Estados Unidos, não a França. Cria-se uma contradição.
Dai porque acham que o mais importante são orçamentos, sistemas contábeis, controles de inventários; gerenciar ativos fixos (equipamentos e provisões), informações (restaurantes, menus, tendências de decoração), recursos humanos (garçons, pessoal de cozinha, pessoal de manutenção, limpeza), tempo (revisar as operações diárias, treinando os outros, comunicando-se claramente, criar ambiente de trabalho bem organizado; comprar, substituir e manter os utensílios).
Landfraf, parece, fez nada disso. Mas por que haveria de fazer? A sua cozinha era excelente, e todos torcíamos para ele sempre estar lá, dando o melhor de si. Então, por que se ocupou da gestão, a ponto do sócio, deselegantemente, vir lavar roupa suja em público? Repetindo: por trás do bistrô francês há, idealmente, um casal. Gente que se dá bem no cotidiano, e que sabe dividir as tarefas entre si. Funciona, enquanto os casamentos funcionam.
Mas o Senhor Ventre não é do ramo (coisa que não se pode dizer de Landgraf). E ele já havia aberto, junto com seu irmão e em sociedade com Landbraf, o Beato na rua Pinheiros. Eles que administravam, não Landgraf. E deu no que deu (achavam bacana só ter uísque 12 anos na prateleira e chamavam isso de "filosofia da casa"). Então, quando diz agora “ele faliu o restaurante” é uma espécie de cospe para cima e cabeceia.
O chef de renome acha que o ativo do restaurante é justamente seu nome. E cuida da cozinha para mantê-lo. Os sócios capitalistas, ao contrário do que as vezes pensam ilusoriamente, precisam se empenhar na boa gestão. Não adianta delegar para o chef. Não dá certo nem aqui nem nos bistrôs franceses.
Em qualquer negócio capitalista, como dizia o velho Marx, o que o capital quer do seu dono é uma coisa só: a alma (tipo assim: o olho do dono engorda o boi...). Se o indivíduo não está disposto a entregar sua alma para o negócio, melhor deixar o dinheiro a juros com essa taxa selic maravilhosa! Confie na alma do banqueiro, não no talento do cozinheiro.
Enfim, o fechamento do Epice dá muito a pensar, pois encerra ensinamentos que todos do ramo deveriam levar a sério para não fazer besteira a curto, médio ou longo prazo.
21/01/2016
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