13/03/2017

Quando se irá discutir a caça racionalmente?



Bem complicada a questão posta pelo projeto de lei 6.268/16 que novamente permite a caça de animais silvestres no Brasil. Já existem ambientalistas histericos com isso. Ele revoga a proibição de 1967, 50 anos atrás, e retira da Lei de Crimes Ambienteais (Lei 9.605/98) o agravamento da pena por matar, perseguir, caçar, apanhar ou utilizar animais sem licença para isso. 

Esta legislação é muito extensa e radical, pois até um cientista, para colher um coleóptero, precisa de licença do Ibama. Mas o órgão é bastante incompetente na gestão ambiental sob este aspecto. Haja vista a praga dos javalis soltos por ai, a destruir culturas no interior de vários estados, inclusive São Paulo. Apesar de espécie exótica, pôs-se o Ibama em sua defesa por décadas. O resultado é o que se vê hoje, tendo o Ibama recuado de sua intransigência burra. Outras espécies também não podem ser consideradas “nativas” stricto sensu, como as aves migratórias, como patos - que vêm do Canada e vão até a Argentina, mas se “param” na Lagoa dos Patos (veja o nome!), não podem ser caçadas, e se estacionam no Uruguai, ai sim podem ser caçadas.




Quando essa proibição surgiu, queria o Brasil se desenvolver institucionalmente na área ambiental para se habilitar para o acesso a fundos internacionais então em expansão. Mas os diferentes países possuem culturas diversas em relação à caça. Ela é legal na Argentina, no Uruguai, em vários países da Europa, nos Estados Unidos. Legal não quer dizer não-regulamentada. Nada disso. Quer dizer apenas prevista em certas circunstancias. 

Para que não seja nociva ao meio ambiente, o controle estrito dos estoques naturais e o estabelecimento de limites de abate é fundamental. É sempre uma má justificativa dizer que o “Ibama não tem pessoal suficiente para fiscalizar”. A caça esportiva, em países como a Espanha, é bastante “sustentável”, isto é, gera receitas que financiam uma boa estrutura de regulamentação e fiscalização. 

Anualmente, o rei abre a temporada de caça às perdizes. Esses animais são criados em cativeiro e soltos para a caça esportiva. Cada exemplar abatido gera uma movimentação de dinheiro da ordem de € 50 - divididos entre criadores, licença de porte de armas, taxas municipais, aproveitamento pela industria alimentícia, etc. Tem-se assim a convicção de que a regulamentação é um bom expediente para preservar as espécies pelos interessados (caçadores).

No Brasil a história é bem outra. A origem da caça não é aristocrática, como na Europa, mas popular. Não só os povos indígenas consumiam regularmente as espécies selvagens, mas qualquer leitor atento dos viajantes coloniais notará a extensão desse hábito, adotado inclusive pelos colonizadores. Quando se proibiu a caça, ela atingiu diretamente camadas populares que ainda mantinham (e mantém agora ilegalmente) esse hábito, como os caboclos ribeirinhos da Amazônia. 

Os criadouros autorizados pelo Ibama para algumas espécies - como capivaras, cateto, queixada, pacas, etc - mostraram-se, em certo sentido, uma boa estratégia preservacionista, e o desejável seria vermos a expansão dessa política aliada a uma regulamentação da caça silvestre. Paca, tatu, cotia, etc. Aves com perdizes, codornas, nhambus etc. Além dos peixes de rio, como o dourado, proibido no Rio Grande do Sul apesar da ampla recuperação dos estoques.

Dificilmente, porém, os lobbies ambientalistas deixarão a legislação avançar nessa direção. Ainda mais que o projeto atualmente em pauta é de inspiração nitidamente ruralista, querendo autorizar o abate de carnívoros (em especial felinos) que pressionam rebanhos agro-pecuários. 


A previsão é, portanto, que as contradições da legislação e os conflitos políticos preservem ainda por bom tempo um ambiente institucional anacrônico.

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