Paçoca é mistura, confusão, que se obtém no pilão, combinando carnes secas, ou amendoim ou castanha do pará à farinha de mandioca ou de milho. Já pamonha é essa coisa molenga, pegajosa, que se cozinha envolto em folha (de bananeira, do próprio milho ou caeté), e que fora desse invólucro é curau.
Na história da nossa culinária é usual se menosprezar as técnicas indígenas e, inversamente, elogiar os ingredientes, entendendo que a solução cultural miscigenada é sempre a submissão dos ingredientes nativos às técnicas européias.
Esses dois exemplos - paçoca e pamonha - são o testemunho do contrário. Pegue a paçoca de amendoim: junte ao amendoim a farinha de milho ou mandioca (no caso, prefiro a de milho) amalgame com o açúcar e o sal - dois componentes aportados pelo colonizador. Temos ai um prato “miscigenado”, cuja função, em suas várias versões (com carne seca, etc) foi servir de alimento itinerante. Coisa de vaqueiro ou tropeiro, por exemplo.
Já à pamonha incorpora-se açúcar, ou queijo ou carne - dependendo do contexto mais amplo em que se insere - ao milho ralado e deposita-se na embalagem natural em que é cozida. Uma vez cozida, também é transportável. Também é o ingrediente nativo - o milho - que absorve os elementos da cultura européia, como o queijo ou a carne moída.
O ralar ou o pilar são os gestos técnicos iniciais. Sua origem remonta a tempos nos quais o português nem era cogitado como problema pelos índios. Estes souberam absorver os ingredientes trazidos pelo colonizador; ou, ao contrário, o colonizador se “indianizou” e absorveu gestos indígenas no seu cotidiano. Tanto faz, não é?
Interessante é como esses gestos, técnicas e produtos foram sendo paulatinamente deixados de lado, por serem considerados comidas “antigas” ou folclóricas (viajando dentro do conjunto da festa de São João, por exemplo), coisa de caipira.
Mas mais incrível é que chefs, chefinhos e chefetes hajam abandonado esse patrimônio culinário em vez de moderniza-lo e faze-lo dialogar com o presente. A rigor, é possível fazer paçoca de qualquer coisa seca: peixe dessecado de qualquer espécie; nozes de qualquer tipo. Ou pamonha com recheios os mais variados (aprecio com gorgonzola, por exemplo, e imagino que o uso do mel em vez do açúcar deva dar bons resultados para pamonha doce). E por que isso não acontece?
Mas mais incrível é que chefs, chefinhos e chefetes hajam abandonado esse patrimônio culinário em vez de moderniza-lo e faze-lo dialogar com o presente. A rigor, é possível fazer paçoca de qualquer coisa seca: peixe dessecado de qualquer espécie; nozes de qualquer tipo. Ou pamonha com recheios os mais variados (aprecio com gorgonzola, por exemplo, e imagino que o uso do mel em vez do açúcar deva dar bons resultados para pamonha doce). E por que isso não acontece?
Muito provavelmente porque nas faculdades - que sustentam a ideologia da miscigenação, reproduzindo o senso comum da área - há, ainda, a ditadura das “técnicas clássicas” (leia, francesas) e um desdém muito grande por técnicas nativas que questionam o edifício todo da classificação ocidental da cozinha. Coisa que em países como o Peru, por exemplo, se faz gostosamente.
Onde você “encaixaria” uma paçoca? E uma pamonha? Esse estranhamento que incide no raciocínio cartesiano da cozinha francesa é insuportável para a estrutura de ensino estabelecida, pois abriria caminho para mais e mais contestações para as quais raramente os professores tem respostas. E depois falam em “modernizar” a cozinha brasileira… Bah!!!
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