27/06/2018

O limite da "revolução verde" não pode nos colocar num beco sem saida




Editorial da Folha de hoje analisa a polemica em torno do pacote do veneno. Desenvolve um raciocínio que pretende ser “equilibrado” e busca um “meio termo” dizendo, entre outras coisas, que “é fantasioso imaginar, como parecem fazer setores da militância ambientalista, que a produção de alimentos para atender grandes contingentes tenha condições de prescindir do uso de pesticidas. O alarmismo dos opositores não contribui para o debate”.

Blairo Maggi declarou há algum tempo que poderia perfeitamente produzir soja orgânica, bastando “o mercado” demandar. Circula também pela internet um vídeo de Leontino Balbo, da fazenda São Francisco (SP), produtor da cana que resulta no açúcar orgânico Native, que aponta o estigma sobre a agricultura orgânica, a exemplo do que a Folha expressa, e demonstra que a “agricultura orgânica revitalizadora”, que a fazenda adota em 20.000 hectares, pode permitir uma redução de 70% no uso de agrotóxicos nos grandes cultivos (cana, soja, milho, algodão) e, por isso mesmo, propiciar um aumento de produtividade de 23% em relação ao cultivo convencional. Há portanto um “gap” de conhecimento dessa grande imprensa ao classificar como “alarmismo” a oposição dos ambientalistas ao pacote do veneno, contra-argumentando com a "produtividade".

A defesa do mercado é sempre algo orientado por maiores lucros, e caberia aos seus defensores no mínimo explicitar quais são as razões para a pretensão da bancada ruralista para intensificar o uso de venenos na atual conjuntura.  Por exemplo, traçar um amplo panorama sobre o mercado mundial de agrotóxicos, as restrições recentes que lhes são impostas em outras partes do mundo (Europa, China...) de modo a procurarem criar um “paraíso” (ou seria
“inferno”?) para a sua produção em maior escala.


Se o aspecto principal para os defensores dos venenos é frisar a produtividade do trabalho, há que considerar também que o mais importante é aquilo que efetivamente se converte em alimento humano, em coisa útil, levando em conta também as altas taxas de desperdício em toda a cadeia alimentar, e não apenas o elo agrícola dessa cadeia.

A “revolução verde” parece ter chegado ao seu limite e não pode ser mantida à custa de mais veneno, nem do avanço da fronteira agrícola sobre as matas nativas. O que se exige de todos – produtores, cientistas, governos – é o esforço para superação desse modelo que a “revolução verde” desenvolveu até a sua exaustão.

Não é difícil entender que a produção agrícola está sujeira às leis naturais, conhecidas ao menos desde que Darwin escreveu a Origem das espécies, e que não é possível contrariá-las sem destruir os processos naturais de produção da vida. A questão da produtividade assim entendida é completamente distinta daquela que “isola” um cultivo do meio-ambiente, pela criação de uma barreira artificial de agrotóxicos que, além do mais, se propagam através dos produtos orgânicos até a ponta do consumo humano.

Reverter esse processo no momento em que a “revolução verde” atingiu seus limites exige o esforço pela construção de um novo modelo, uma nova lógica de produção, distribuição e consumo – enfim, uma nova cultura - que o agronegócio brasileiro está longe de pretender liderar.  Tornam-se então os seus representantes um obstáculo nesse caminho e, como tal, precisam ser combatidos.

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