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09/07/2014

A cozinha e o amor

Atualmente, talvez nada apareça com maior frequencia associada ao termo “cozinha” do que a palavra “amor”. “Cozinhar com amor” parece ser o mantra que supera todas as adversidades da vida, colocando o sujeito num plano superior de existência. O próprio Hervé This, um homem dedicado às ciências naturais e em colaboração com Pierre Gagnaire (La cuisine c´est de l´amour, de l´art, de la tecnique, Paris, Odile Jacob, 2006), estabeleceu essa mesma equação. Mas, qual é a relação entre os dois conceitos?

Hervé quer saber se a cozinha é um affaire d´amour. Depois de tanto se dedicar à química e física na cozinha, resolveu investigar os aspectos simbólicos do cozinhar que possam se materializar na coisa comestível. Portanto o caminho que explora pode servir de parâmetro para outras investigações de  natureza semelhante: a magia, a homeopatia, e por aí vai... bastando que nos deparemos com a ideia de eficácia material do simbolismo.

Imaginei também tratar desse tema no Formação da culinária brasileira. Escritos sobre a cozinha inzoneira mas, de ultima hora, desisti de incluir no livro o escrito que havia preparado. Isto não quer dizer que o assunto me abandonou ou eu o abandonei. Tão fácil dizer bobagem sobre isso - e os meios de comunicação estão cheios delas - que é melhor a cautela. Mas, vamos lá, exploratoriamente.

Não é fácil definir o amor, tantas são as suas formas reais. Portanto é necessário escolher um claro ponto de partida para desenvolver o raciocínio. Deixando de lado a pieguice, digamos que o amor é esse sentimento egoísta no qual me satisfaço ao infrigir satisfação ao outro. A troca que existe nele é de satisfação X satisfação, que, na cozinha, assumirá a forma particular de fazer X consumir.


É fácil delimitar o prazer de consumir a partir dos nossos aparelhos fisiológicos e mecanismos simbólicos: posso até gostar de algo que venha envolto em significados que me são caros, mesmo quando o sabor percebido não seja tão apreciado.

Já o prazer de fazer é mais complexo. O cozinheiro precisa, primeiramente, saber algo da cultura culinária. Em segundo lugar, extrair de um amplo repertório uma receita que me caia bem, expressando seu apreço por mim. Em terceiro, precisa imprimir naquela receita algo que o particularize como executor, conferindo sentido único à oferenda. Nesse caso pode também ser algo exibicionista, pavoneamento.

Como em geral nas práticas sociais de doação os papéis se alternam no tempo (quem recebe tem a obrigação social de retribuir), todos terão oportunidade de ocupar os dois polos da relação.

Procurei mostrar no caso do “estilo feminino de cozinhar” (Formação..), que a satisfação é mais fácil na relação mãe-filhos, ou no âmbito doméstico em geral. A razão é se conhecer melhor as idiossincrasias de cada um. Quem cozinha pode se ajustar a quem vai comer através desse tipo de conhecimento, favorecendo aquela comunhão de propósitos que satisfaz. É inegável que o ovo frito com a gema no ponto que você gosta expressa esse acolhimento que quem cozinha quer lhe proporcionar.

Seguro que tudo o que ocorra no âmbito doméstico pode ter essa marca distintiva e,  pela recorrência, é assim que o próprio gosto se forma como medida das coisas que se comerá fora de casa. Mas, e o que ocorre no âmbito público, em um restaurante por exemplo? Muito difícil estabelecer. Fica para outra vez, se eu conseguir avançar.

16/03/2012

Um abismo se abre à mesa

“Só para nós não morre aquilo que morre conosco”
D´Annunzio


O fogo deixa de ser o porto seguro da gastronomia, e os "meio crus" descortinam o conflito entre desejo e repulsa.


Cliente sempre tem razão. Devolve o camarão porque está “cru” ou malpassado. Ou então afasta o prato, como a dizer que o animal onívoro é uma ilusão da ciência. Os chefs não sabem o que fazer.

“Se eu mando um camarão no ponto que eu gostaria, não raro o cliente só come o rabo, que está mais cozido, e despreza o resto”, diz, perplexo, o chef Alex Atala. Isabella Masano, a ultrajovem chef do Amadeus -um dos raros restaurantes paulistanos especializados em frutos do mar- também gostaria de fazer uma culinária ultramoderna, mas esbarra na mesma limitação: o “ponto de cocção” do que vem da água.

No geral, o cliente está disposto a defender a tradição. Ele rejeita tudo o que não seja bem cozido. Ou cru, como atesta a proliferação de restaurantes japoneses. Já os chefs, no processo criativo, às vezes precisam romper as fronteiras do estabelecido. A sorte é quando alguém os compreende.

Entre o cru e o cozido -seja lá o que signifique objetivamente cada termo- parece residir um “defeito” de preparação. Mas quando este ponto é buscado intencionalmente não se trata de defeito. O defeito reside onde o trabalho falhou nos gestos que levariam ao resultado planejado, conforme ensinou Marx.

Qualquer gourmet sabe que o foie gras revela as melhores qualidades do fígado de ganso ou pato, potencializa seus aromas e sabores sutis, quando cozido a baixas temperaturas por um tempo limitado. O fígado fica “mi cuit” (meio cozido), como se diz. A carne vermelha sangrenta (“saignant”) é apreciada em quase todas as churrascarias, ainda que não pela totalidade dos clientes. Parece apenas uma “questão de gosto”, jamais um defeito. Só para carne de porco é imperativo o ponto ultracozido, memória cultural de antigo anteparo sanitário à sujidade bíblica desse animal.

O ponto de cocção dos peixes também possui o seu “saignant”. Ele é óbvio no caso do atum pela sua coloração próxima à da carne de animais de “sangue quente” (e se são “quentes” talvez não requeiram mesmo tanto calor novo...). Para outros peixes, o ponto é chamado tecnicamente “rose a l’arête” (rosado na espinha) -que é quando o animal parece cru por dentro mas a espinha se destaca facilmente da carne. Ainda que muito sujeito a controvérsias, o “rose a l’arête” parece inadmissível quando em mariscos ou moluscos... que sequer possuem espinha. Nestes casos, não raro, o que se vê à mesa é a repulsa. Ao gourmet desavisado parece faltar o chão, pois foi empurrado para o abismo.

O que é isso que causa tanto asco, estacionado a meio caminho entre a natureza crua e o antegozo do cozido? Evidente que a questão não diz respeito a saciar a fome, pois ela só existe quando se observa o comportamento gourmand. E facilmente se aceitaria que é uma questão mais afeita à psicanálise do que à gastronomia.

Psicanálise do fogo. Gaston Bachelard dá o mote: “O fogo sugere o desejo de mudar, de apressar o tempo, de levar a vida a seu termo”. E o gastrônomo é, como o fogo, um predador voraz. O seu desejo é um fogo interior que o consumirá se ele não consumir o que o despertou. Ele está sempre em desarmonia com a natureza, e as refeições são gozos que serenam o desvario.

Como escreveu Manuel Vázquez Montalbán, que penetrou tão fundo na alma gourmet, este é um tipo de pessoa que “jamais esquece o nome do morto. E mais, enquanto o come faz menção expressa a ele, seja javali ou alcachofra, e recorda outros assassinatos e devorações (...). A chamada arte culinária se baseia no prévio assassinato, com toda classe de aleivosias”. Ou ainda: “Comer significa matar ou engolir um ser que esteve vivo, seja animal ou planta (...). Mas, se marinamos a fera para cozinhá-la posteriormente com a ajuda de ervas aromáticas da Provence e um copo de vinho, então realizamos uma deliciosa operação cultural, igualmente apoiada na brutalidade e na morte”.

O gourmet é sobretudo um predador covarde. Não se expõe em campo aberto ao perigo do animal que luta, nem à gosma dos moluscos, e mesmo os vegetarianos parecem animistas piedosos e hipócritas. O gourmet só se apropria da natureza morta e esta, como tema da pintura, visa celebrar o seu triunfo mesquinho sobre a pulsão vital, através de uma representação metonímica.

A ostra viva parece uma exceção. Mas acaso haveria algo mais inofensivo do que a vida da ostra que se esvai enquanto o gourmet pinga sobre ela gotas de limão para surpreender-lhe o estertor? O limão é a sentença de morte que ele, pessoalmente, administra ao animal trazido ao patíbulo da mesa. Aos neófitos horroriza este ritual que é observar a contração agônica do molusco. Horror que a vivência e o tempo atenuam. Horror que não se mostra diante do ascetismo do sushi, pois neste a vida foi tão miudamente retalhada que é impossível reconhecer traços da “anima” que se dissipou.

Mas a gastronomia é, através das suas modas, expressão do espírito de época. As ostras e as trufas só ocuparam o centro da mesa no pós-renascentismo, expulsando as carnes “negras” e pesadas, isto é, com a nova moda que pôs fim às mesas sobrecarregadas de caças de todo tipo, de pirâmides de frangos, vitelas ou cabritos inteiros, tão ao gosto dos barrocos italianos. Em outras palavras, a reforma do gosto do século XVIII leva ao fim os “ranços góticos” e a “intemperança asiática” da cozinha seiscentista, demasiadamente ligada à herança medieval e ao mundo oriental das especiarias.

São exemplo do aperfeiçoamento dietético os iluministas franceses -“homens-novos” que condenavam os excessos barrocos- e que preferirão se alimentar “de organismos gelados, inertes e semi-cadavéricos, saídos murchos da água ou de bulbos estéreis, inimigos da luz, nutridos pela umidade noturna e lunar do subsolo das vastas florestas outonais. É singular, mas não paradoxal, que o virtuoso, rigoroso, abstêmio e vegetariano Robespierre (que compartilhava com os ascetas a ‘triste singularidade de só comer ervas’) mandasse sacrificar os bichos reais de Versalhes, decapitando tanto a ondulada silhueta da rainha quanto o grave monarca amante das artes de Vulcano, estudioso das técnicas do fogo”.

É possível mesmo que certas filosofias se aproximem de determinadas culinárias, o que daria razão aos chefes ultramodernos que costumam batizar de “filosofia” os conceitos simples nos quais apóiam as suas práticas. Assim, podemos indagar: o que pretende esta cozinha de agora que nos empurra para o meio do caminho entre o cru e o cozido ou, em outras palavras, qual a sua filosofia subjacente?

Mas voltemos à ostra. Tecnicamente, a ostra ao limão não é “crua”. Dentre as formas de “cocção sem fogo” está a submissão do alimento a um meio ácido. ”Marinar” (submeter a um “mar”) é outra forma corrente de transformar o alimento. Também ao bacalhau o sal suga a “anima”, convertendo-o em coisa comestível sem mais delongas. O álcool vertido sobre a clara do ovo produz uma espécie de “ovo poché”, e a gema batida com açúcar é dita “cozida” pelos pâtissiers.

A coisa salada, desidratada ou coagulada tem passe para o mundo dos “cozidos”. Assim como o calor, outros processos alteram a organização das moléculas, produzindo o mesmo efeito. Por isso o cozinhar, como sinônimo de “aquecer”, ficou na galeria dos arcaísmos, ao lado da fronteira ultrapassada dos 100 graus centígrados. Só os dicionários sustentam a idéia anacrônica de que a fonte da cocção é o calor.

A cozinha ultramoderna tem abraçado processos de transformação em baixas temperaturas, isto é, abaixo de 100 graus, e com resultados bastante satisfatórios, o que abre uma verdadeira avenida para o prazer gastronômico. Isso vem se tornando possível mesmo domesticamente, graças a recentes avanços tecnológicos, como a invenção do Termomix.

A ocupação tranqüila desses novos territórios exige as novas filosofias. No último encontro de gastronomia de vanguarda (Madrid Fusión, janeiro de 2005) um dos chefes mais celebrados submeteu um lagostim a um “vapor” sem água, isto é, a uma panela de vapor aquecida e vazia onde jogou uma pitada de curry para que este aromatizasse o crustáceo. Em menos de sessenta segundos estava arranjando o lagostim no prato, e ainda se via a sua flexibilidade de coisa outrora denominável “crua”.

Quanto mais se controla a cocção de modo exato, mais fica claro que a passagem pelo fogo também simboliza a “passagem” da natureza para a cultura, ocupando a culinária o centro desse processo de afastamento da pura naturalidade. É um processo que coincide com a construção de uma “segunda natureza”, apoiada na técnica, nos instrumentos, na linguagem e no próprio fogo controlado; e as mitologias dos povos sempre organizam algum discurso sobre essa passagem, em geral como fruto da intervenção de um herói criador.

No pólo oposto à cozinha está a podridão, o terreno no qual o alimento desliza, de modo lento ou rápido, de volta à natureza, decompondo-se, pela ação dos fungos e bactérias, nos elementos minerais que antes estavam organizados. Os gourmets tentam ainda, desesperadamente, segurá-lo no despenhadeiro por onde se precipitam, celebrando a culinária da coisa “faisandé”.

Ao controlar o processo de deterioração, a própria cultura ampliou as suas fronteiras, incorporando mais natureza. Também por esta vertente há uma história. Descobriu-se a penicilina, a “podridão nobre” dos vinhos de Sauternes, os queijos etc. Pasteur é, inegavelmente, um herói criador moderno. Foi ele quem nos deu as conservas duradouras.

Como para as descobertas de Pasteur, as investigações sobre a cocção a baixas temperaturas também tiveram uma motivação prática: era preciso eliminar as salmonelas encontradas dentro do ovo, sem destruir o ovo poché. Os ingleses não viveriam felizes sem o seu ovo quente matinal, e a gastronomia -como a política- visa a administração da felicidade.

À meditação em torno do ovo contaminado se deve a ocupação culinária do território gastronômico que se aninhava entre os 60 e 100 graus centígrados. Hoje, muitos chefs se notabilizam por explorar esta faixa térmica. Desenvolve-se aí, por exemplo, a cozinha no vácuo. A invenção de instrumentos como o Termomix é apenas um desdobramento tecnológico dessa nova necessidade. Outros chefs, diante da queda das barreiras térmicas, já exploram o território do ultrafrio (a cocção em nitrogênio líquido), como se buscassem o antifogo. Certamente, das profundezas do freezer, será necessário arrancar e descongelar uma nova filosofia...

Mas a inclusão de peixes e crustáceos na “terra-do-meio” que é o domínio do “meio cru” diz respeito à preparação cultural da sociedade, e não apenas à criatividade e à inquietação do chef. E o animal só é levado à “terra-do-meio” porque entre nós, ocidentais, as fronteiras da cultura são relativamente móveis.

Um crustáceo, despido do seu exosqueleto, se nos revela como um verme com excessiva liberdade, uma potência ameaçadora. Amornado, dissimula o propósito de nos comer por dentro, mas não engana o astuto. E só sentimos segurança quando ele está paralizado pelo rigor cadavérico que a cocção profunda impõe. O fogo, que leva a vida ao seu termo, nos salva, mas se a cocção pára a meio caminho parece que a natureza irá nos devorar triunfalmente. Aí, o gourmet não come. Simplesmente afasta o prato. Como o personagem humilhado de um conto de Clarice Lispector.

Mas tudo é uma questão de tempo. Não há humilhação que o gourmet não olvide em troca de algo memorável na sua galeria de morticínios.

(Texto publicado originalmente na revista eletrônica Trópico, em 2005)

21/04/2011

Decálogo (de 11 pontos!) de Gastón Acurio

Queridos estudiantes de cocina, que en el Peru ya suman 50,000. Aqui algunos principios de nuestra cocina que ojala abrazen en sus vidas.

1.- Nuestra cocina existe gracias a nuestra infinita biodiversidad. Recoger los productos de nuestra tierra, y cocinarlos buscandoles su lado mas bello. Respetar, promover y defender nuestra biodiversidad a travez de la cocina. Es nuestro principio y compromiso inalienable

‎2.- principio dos.- la inclusion. Buscar que esta biodiversidad sirva para que a travez de la cocina hagamos felices no solo a cocineros y comensales sino tambien a los productores que trabajan dia a dia a veces en durisimas condiciones para llevar estos productos a nuestra cocina. Luchar para que la cocina sirva de instrumento y oportunidad para reconocer su labor y mejorar sus vidas.

‎3.- prncipio tres.- Que nuestra cocina sea un instrumento para celebrar nuestra diversidad cultural. Continuar el camino que iniciaron nuestras generaciones pasadas al construir una cocina en donde todos y todas tenian una voz, convirtiendo nuestras diferencias en una virtud y una oportunidad. Demostrandonos que la cocina es un ejemplo de tolerancia y concordia digno de imitar.
4.- promover y abrazar la excelencia en todos sus frentes. incentivando a campesinos y pescadores en la calidad total y compromiso ambiental y sostenible a partir de una relacion de precios justos. Promover en nuestros restaurantes la busqueda de la excelencia e inspirar al comensal a emocionarse con el sabor y con una etica culinaria que va mas alla del mero placer.

5. -. Que nuestra cocina sea un espacio de union entre todos. Cocineros, productores,
comensales, juntos construyendo una atractiva marca llamada cocina peruana cuyo exito termine beneficiando a todos por igual. Que entendamos que ninguno esta por encima de otro de manera que mirandonos y sintiendonos parte de un mismo equipo auxiliemos el fracaso ajeno de la misma forma que aplaudamos su exito.

6‎- que nuestra cocina busque promover nuestra cultura y productos por el mundo. Entender que se nos ha entregado lo mas hermoso de nustra cultura y por ello es nuestro deber el llevar esta bandera por el mundo. Porque con ello estaremos contribuyendo a mostrar un nuevo Peru, que es capaz de seducir al mundo no solo con materias primas sino con lo que somos , hacemos, creamos y sentimos.

7. ‎.- cultivar la humildad como ingrediente esencial de nuestra cocina. En este mundo en donde los cocineros se han convertido en personajes mediaticos, resistir a la tentacion de la vanidad y el ego. No olvidar nunca que el hecho de poder ejercer el oficio de cocinar cada dia es mas que suficiente para estar agradecidos con la vida.

8. ‎.- El restaurante no como punto de llegada sino de partida. El cocinero no puede encerrarse en una vida que gira en esperar que lleguen clientes. Hay que salir de nuestrascocinas yabrazar causas masinspiradoras, comercio justo,medio ambiente, sostenibilidad, tolerancia.regresar con ellas a la cocina e incluirlas en nuestros platos. El resultado: una cocina mas hermosa y poderosa que toque los sentidos y el corazon

‎9.- Que el Peru sea tu casa y el mundo sea tu barrio. Nuestra cocina se ha nutrido siempre de todo lo bueno que el mundo ofrece. lo probamos, lo incluimos y peruanizamos. Mal hariamos en creer que ha llegado el momento de cerrar esa ventana siempre abierta al mundo. Mantengamosla abierta a todo lo que el mundo tiene para compartir y sumemoslo a todo lo bueno que nosotros tenemos para compartir con el mundo.

‎10.- la tradicion de hoy no sera la tradicion de mañana. Defendamos nuestras tradiciones hoy con la misma pasion que buscamos nuevos sabores y tecnicas para mañana. Que nuestras tradiciones nos inspiren y llenen de orgullo, que sean nuestra bandera y nuestro rostro de este nuevo Peru, pero que nuestra sed de innovacion nunca desmaye por ello. costruyamos para siempre el abrazo definitivo entre tradicion y modernidad.

11. ‎ Entender lo anterior en una frase. EL PODER DE LA COCINA. Para incluir, unir, promover, valorar, transformar, inspirar, confiar, compartir, soñar, amar. Comprender que la cocina no es mas espacio meramente ludicos. Que el cocinero puede contribuir a un mundo nuevo en donde la estetica y la etica, el lujo y la inclusion, la excelencia y la humildad, el orgullo y la tolerancia, se abrazaron para siempre.

14/10/2010

A educação do paladar do cozinheiro



A educação do paladar é como a educação do ouvido: no princípio, tudo é barulho e, por fim, musica; tudo é sabor e, por fim, comida requintada com sabores equilibrados.

Não se começa a tocar por partituras, mas antes explorando os instrumentos, tentando compreende-los, dedilhando as cordas, pressionando as teclas. Depois, prestando atenção em como os outros tocam, ou ouvindo musicas e tentando imitá-las. Por fim, aprendendo escrita musical para ler partituras. Na cozinha, tenta-se começar pelo fim – pela partitura. E se amaldiçoa o “maestro” se ele não escreveu uma partitura para principiantes, inclusive ensinando a afinar o instrumento!

Compra-se livros de partituras culinárias e lê-se as notas uma a uma, com detalhes de gramas. Se – como diria Tim Maia – “o som não sai legal”, deixa-se de lado o livro de receitas e as esperanças.

Com diz Nina Horta em sua crônica de hoje: “a linguagem oculta da cozinha também pode ser um obstáculo. É preciso estudá-la como estudamos qualquer outra matéria. Claro que alguns terão mais facilidade do que outros, alguns vão parecer que nasceram sabendo, alguns vão desistir e mudar de rumo, tudo igualzinho às outras disciplinas do vestibular. Estudo, experiência, memória, imaginação, abertura, prazer, ritmo, astúcia e a visão da comida como uma língua a se aprender e que devemos interpretar segundo nossas possibilidades e vivências”.

Mas cozinhar é muito simples, mais simples do que tocar um instrumento e, dele, “tirar” uma música. Mais simples porque o seu paladar lhe acompanha desde sempre e, como no caso da música, é preciso confiar nele como guia. Se o ouvido leva do barulho à musica, por que o paladar não poderia nos conduzir do caos gustativo ao prato?

Começa-se com melodias simples: uma carne temperada com sal e simplesmente cozida. Uns legumes cozidos, aos quais se espreita, cutucando com um garfo, para que não passe do ponto que você imaginou; um arroz refogado, ao qual se vai colocando água até ficar no ponto desejado, e assim por diante. É simples porque qualquer coisa pode, segundo esses livros exigentes, levar “sal a gosto”. Dia a dia, conquista após conquista, vai se avançando em direção a pratos mais complexos e se verá que quase tudo, a rigor, é “a gosto”.

O fato é que não se parte da quantidade de ingredientes das receitas mas, sim, do bom senso de cada um, porque o prato só estará pronto dessa perspectiva – não quando chegar a corresponder ao juízo do escritor da receita.

Uma vez, contei a um grande chef frances como eu fazia determinado prato que ele estava demonstrando; e ele retrucou: “- Assim o senhor faz na sua casa, na minha eu faço à minha maneira”. Parecia uma grosseria, mas era, na verdade, um grande ensinamento. Cada um à sua maneira. Ou será que os músicos tocam todos iguais?

Por isso não acredite quando lê: pique uma cebola média; 10 cravos; 125 gramas de açúcar; 75 gramas de manteiga, etc. Coisas assim não dizem nada, e certamente não levarão ao resultado que já existe pronto na sua cabeça.Prefira receitas como a que li num livro português: 3 a 5 sardinhas, dependendo do tamanho delas e da fome dos comensais... Nada mais preciso, pensando bem!

10/08/2010

Decantação - para que serve

A decantação se obtém apenas derramando o vinho em outro recipiente e pode suavizar o sabor de vinhos tintos jovens rascantes, simplesmente expondo-os ao oxigênio; mas também serve para retirar os sedimentos em em vinhos idosos vintage. Os vinhos brancos, que são envelhecidos por períodos mais curtos, não se beneficiam da decantação.

Alguns vinhos tintos jovens - entre três e 10 anos de idade - podem ser adstringentes se consumidos imediatamente após a abertura da garrafa já que eles foram mantidos em um ambiente relativamente livre de oxigênio durante o envelhecimento. Ao longo do tempo, essa condição resulta num caráter "fechado” que decorre do acúmulo de compostos especificos.

A mudança do aroma do vinho se dá durante os primeiros 10-30 minutos após a abertura. A decantação acelera o dito “processo de respiração”, que aumenta o aroma de frutas e carvalho natural no vinho, permitindo que algumas substâncias voláteis se evaporem. A decantação também parece "amolecer" o gosto dos taninos que causam aspereza e adstringência, apesar de químicos não detectarem alterações perceptíveis para os taninos. Mudanças menos dramáticas ocorrem quando simplesmente descorchamos a garrafa entre 15 a 60 minutos antes de servir.

Nos vinhos mais velhos a decantação também serve para retirar os sedimentos, que são inofensivos mas fazer o vinho turvo ao olhar e arenoso ao paladar. Ao contrário dos vinhos mais jovens, os vinhos mais velhos devem ser servidos imediatamente após decantação, pois o bouquet da garrafa pode ser fugaz. (Andrew L. Waterhouse, a professor in the department of viticulture and enology at the University of California, SCIAN, December 2005, pág. 31)

24/05/2010

Técnicas culinárias, técnicas do corpo & ferramentas

O corpo é o principal instrumento do fazer culinário. As ferramentas culinárias, da faca ao mais sofisticado equipamento utilizado na “culinária molecular”, são, em geral, expedientes que visam economizar gestos ou conferir-lhes maior precisão. Mas o empenho físico com destreza é o primeiro responsável pelos resultados alcançados, e não raro será também o modelo do desenvolvimento tecnológico.

Marcel Mauss definiu as técnicas do corpo como “as maneiras pelas quais os homens, de sociedade a sociedade, de uma forma tradicional, sabem servir-se de seu corpo” e imaginou poder construir uma teoria sobre elas “procedendo do concreto ao abstrato, não inversamente”.

Nadar, marchar, fazer sexo e, claro, cozinhar, comer, mobilizam nossos corpos de diferentes maneiras, variando de sociedade para sociedade ou mesmo de geração para geração dentro de uma mesma sociedade. O Kama Sutra é, em boa medida, um tratado sobre técnicas do corpo. Assim como as codificações de gestos culinários feitas por Escoffier.

Mauss entende todos esses conjuntos técnicos como “montagens fisio-psico-sociológicas de séries de atos. Esses atos são mais ou menos habituais e mais ou menos antigos na vida do indivíduo e na história da sociedade”. Ele acha que a dimensão psicológica funciona como uma “engrenagem”, e não causas, exceto nos momentos de criação ou de reforma.

A educação técnica consiste em adaptar o corpo ao seu uso. A psicologia individual busca a adaptação e é comandada pela educação, pelo convívio. Mauss destaca, em particular, a educação para o “sangue frio”, para o perigo. Essa educação serve como um retardamento, ou inibição de movimentos desordenados e, portanto, permite uma resposta coordenada de movimentos coordenados que partem em direção ao alvo escolhido.

Em outras palavras, a sociedade permite a “intervenção da consciência”que, por sua vez, aumenta a segurança, a presteza dos movimentos, o domínio consciente sobre as emoções e o inconsciente. O que é feito de modo consciente será superior em relação os comandos inconscientes, tendo em vista o resultado perseguido.

Mas as técnicas podem ser analisadas também em função do seu rendimento ou destreza. Acabam gerando normas de adestramento humano, assim como fazemos com os animais. Homo habilis é o homem que “sabe como fazer”, independentemente da clareza do treinamento; assim como o animal faz coisas por “instinto”, isto é, por habilidade adquirida e transmitida em geral por imitação, mesmo que inconsciente. A transmissão da técnica com vistas ao seu resultado ou destreza, inclui uma série de detalhes inobservados e por isso seria fundamental nos debruçarmos sobre eles, desde a educação da criança. O fundamental é esse longo processo de se empenhar o corpo, como se fosse um simples instrumento ou uma sofisticada ferramenta, na realização de uma idéia ou projeto.

Essas teorizações de Mauss no seu ensaio “As técnicas do corpo” (1934) ficam ainda mais interessantes no domínio da culinária quando as associamos ao papel dos instrumentos e ferramentas no trabalho humano, conforme Darwin especulou em várias passagens de seu A descendência do homem (!871).

Um instrumento é uma coisa circunstancial que posso utilizar de uma maneira imanente. Apanhar um pedaço de pau para alcançar um fruta numa árvore, ou utilizar o mesmo instrumento para desfechar um golpe num animal ou num inimigo.

A ferramenta, ao contrário, é construída para uma finalidade. A faca, para cortar. O tacape, para a guerra, e assim por diante. Ela é uma forma que cristaliza uma finalidade e, assim, deixa de ser imanente. Transcende as circunstâncias particulares de uso, acumula em si os usos futuros. Opera como um símbolo numa linguagem que é muda. O modo como o homem empenha o seu corpo no uso de uma ferramenta é também uma técnica. Por exemplo, como cortar legumes.

As ferramentas propiciaram a evolução humana e, com ela, a transformação dos próprios gestos. Um animal não humano poderá fazer uso de instrumentos, mas jamais poderá fazer ferramentas, pois falta a ele a linguagem simbólica que permita lidar com situações hipotéticas, o que é a base do desenvolvimento ferramental. Por isso, para executarem funções novas, os animais necessitam milênios – para formar novos órgãos – ao passo que o homem faz isso numa mesma geração.

A culinária é um terreno onde muito freqüentemente as técnicas do corpo se combinam com o uso de múltiplas ferramentas, resultando em algo bastante complexo. E as culturas culinárias variam entre sociedades e entre épocas.

Muitas delas se perdem com o tempo. Por exemplo, como abater um frango, depená-lo e sapecá-lo ao fogo antes de iniciar a execução de uma receita qualquer. Os frigoríficos acabaram com isso e, diante de um frango vivo, a maioria esmagadora dos cozinheiros não sabe o que fazer, a não ser imaginar como prepará-lo a partir do momento em que seja disposto, morto e limpo. Um conjunto de gestos ou técnicas do corpo se perde quando a sociedade redefine o modo de produzir determinado bem comestível.

As pessoas com mais treino culinário sabem identificar visualmente um cozinheiro pelos gestos que eles fazem. Uma determinada maneira de pegar a panela, uma determinada maneira de argumentar com gestos angulosos cortando o ar, e assim por diante. São gestos ainda mais perceptíveis numa mulher do que num homem, visto que o treinamento profissional para cozinhar resume gestos desenvolvidos mais por uma cultura masculina do que feminina, de forma que contrastam bastante com o padrão gestual que a cultura espera de uma mulher.

Os gestos femininos estão ligados à culinária doméstica, os masculinos à profissional. Poucas são as exceções, como em alguns ramos da patisseria, onde muitos gestos permanecem “femininos”.

As culturas culinárias são conjuntos de técnicas do corpo, empenhadas ou não no uso de ferramentas. As ferramentas se modificam, suprimindo gestos ou ampliando os seus resultados a partir de procedimentos mais simples. Os cortadores de batata de hoje, por exemplo, dispensam o enorme treinamento que era necessário para fazê-las homogêneas.

A “revolução técnica” pós-gastronomia molecular esfacelou uma série de gestos culinários. Ferramentas novas (inclusive químicas) se interpuseram entre o cozinheiro e o produto de uma maneira também nova: muitos produtos não são atingíveis exceto através delas. Técnicas complexas (como produzir baixas temperaturas) aliviaram o empenho do corpo (atenção, administração do fogo, etc).

Em geral as ferramentas se desenvolvem para aumentar a produtividade do trabalho culinário. Mas nem sempre é assim, como a “descoberta” casual do microondas. Talvez por isso mesmo ele seja tão subutilizado, domesticamente ou em restaurantes. O seu desenvolvimento não atendeu a necessidades do trabalho culinário, para apoiar ou aliviar o empenho técnico do corpo num produto. Afinal, nos milênios anteriores nunca se havia experimentando cozinhar de dentro para fora da matéria-prima. O microondas veio de fora da lógica da cozinha.

Talvez por isso existam tantos livros de “receitas para microondas”, buscando introduzi-lo nos espaços de trabalho culinário, em contraste com as obras quase inexistentes que ensinem a cozinhar num forno convencional ou numa panela. Todos sabemos o quanto seria absurdo um livro de “receitas para facas”. As ferramentas simples são incorporadas ao trabalho como extensões do corpo. As complexas encontram maior dificuldade.

Há também ferramentas que incorporam gestos inúteis, como o movimento em “8” que certas batedeiras mantêm. Está provado que isso não faz sentido, mas o gesto está lá, mecanizado e eletrificado, como a demonstrar que a “tradição”, em cozinha, tem dificuldade em abrir passagem para os novos conhecimentos.

Por essas razões é que cozinhar – especialmente “cozinhar bem” – é saber empenhar o corpo no trabalho culinário cujo resultado é socialmente esperado, muito mais do que “seguir” qualquer receita, pois esta jamais substituirá a destreza no empenho do corpo – a não ser num nível tecnológico muito elevado, como no uso do microondas, quando basta “apertar um botão” e ler afirmações sobre os resultados que provocará em determinadas matérias-primas.

17/12/2009

Psicanálise do leite condensado

A cronica de hoje da Nina Horta, na Folha, me permitiu um mergulho psicanalítico. Ela recorda drinks antigos. E me lembrei que minha bronca com o leite condensado tem a mesma origem: uns drinks que se servia em festas e bailes, chamado meia-de-seda. Era o ó-do-borogodó com gosto de festa de debutantes.

01/11/2009

Tortas & pastelões

Curioso como certas formas culinárias tornam-se geradoras de outras, enquanto elas mesmas perdem terreno ou desaparecem. É o caso do que hoje chamamos tortas, que eram chamadas “pasteis” na tradição portuguesa - tão presentes na cozinha medieval de toda a Europa.

O capítulo das tortas se refere àquilo que, refogado, é colocado em um vasilhame forrado ou não com massa, obrigatoriamente coberto com massa e levado ao forno. O Livro de cozinha da infanta D. Maria traz várias receitas delas. A Europa medieval e dos séculos XVII e XVIII consome esses pastéis por toda parte.

Curioso como Françoise Sabban mostra que a lasanha deriva dela. A massa de cobertura das tortas se “descola” do conjunto e se torna independente. Essa massa, cortada de várias formas, origina os macarrões frescos. O recheio das tortas se torna "externo", o recheio dos macarrões. A exceção é a massa seca de grano duro do Sul da Itália, que vem do Norte da África por influência dos judeus.

Os pastéis de fritar devem ter tido a mesma origem na torta, ou se adaptaram à influência chinesa. Muita coisa disso veio para as Américas. Como as empanadas. Quiçá a nossa empadinha e o pastel de angu mineiro derivem da mesma matriz.

Hoje as tortas são exclusivamente domésticas. Não ganharam o mundo dos restaurantes. Apenas as quiches se desenvolveram nesse terreno. Mas a estas falta a massa de cobertura, que parecia o essencial nos pastéis medievais.

13/10/2009

Os franceses e as palavras...

Como Luiz Américo registrou por via indireta, Hervé This está às voltas com a dicionarização da sua expressão gastronomia molecular e não quer vê-la confundida com culinária molecular, que é o que ele mesmo acha que Adrià e outros fazem.

Hervé se pensa como um Lavoisier da cozinha. Tanto é que o nome de seu principal livro deriva do Tratado de Química, de Lavoisier.

Acontece que Adrià acha que não faz culinária molecular. Acha que faz uma melange de técnicas e emoções, e só adotou essa denominação bem pouco esclarecedora para se colocar fora da tutela científica de Hervé. Mas ele mesmo confessa, em Secretos de El Bulli, que sua vida mudou totalmente quando assistiu a uma palestra de Hervé This na Fundação Escoffier.

Então, por que esse preciosismo de Hervé, que criou as duas expressões? Talvez a resposta esteja num trecho de Lavoisier que ele mesmo gosta de citar: “a impossibilidade de isolar a nomenclatura da ciência e a ciência da nomenclaura deve-se ao fato de que toda ciência física se baseia necessariamente em três coisas: a série de fatos que constituem a ciência, as idéias que as representam e as palavras que as expressam [...]. Como são as palavras que conservam as idéias, e que as transmitem, resulta que não se pode aperfeiçoar as linguas sem aperfeiçoar a ciência, nem a ciência sem a língua”.

Na verdade Hervé acha que os cozinheiros nunca abandonaram o empirismo, e não quer ser confundido com eles no que faz.

É isso ai.

01/10/2009

O exótico em nós mesmos

O que é o "exótico"? O dicionário não deixa dúvidas: "não originário do país em que ocorre; que não é nativo ou indígena; estrangeiro". No entanto, usa-se muito no sentido do "que é esquisito, excêntrico, extravagante", aplicado aos produtos naturais do país.

O bacuri, o cupuaçu, o pequi, são exóticos? Não, não são exóticos! Exóticos são o trigo, o alface, o arroz, e assim por diante.

A inversão de sentido produz consequencias: aumenta a dificuldade de nos reconhecermos, favorece nos vermos como "estrangeiros na própria terra".

Claro, é apenas um detalhe. Mas os que buscam construir uma "identidade culinária" muito ganhariam usando as palavras corretamente.

29/09/2009

A construção do "tipico"

A identidade é vista quase sempre como o resultado da fruição do “típico”. Mas, o que é o típico?

Uma pessoa, formada em sociologia e que faz importantes pesquisas sobre a cozinha brasileira, formulou a seguinte tese: “A aplicação de ingredientes nativos às receitas seculares, assim como a incrementação de receitas indígenas e africanas com técnicas e ingredientes trazidos pela mão portuguesa continuaram a definir pratos nacionais”. Tese de quem pesquisa identidade, tipicidade, patrimônio culinário.

Mas, raciocinemos. O que são “receitas seculares”? As antigas com mais de 100 anos, é certo. E o que significa “a aplicação de ingredientes nativos a elas”? Digamos, fazer um pão de mandioca com receita proveniente de Portugal, onde era feita com farinha de trigo. Mas, na fórmula acima, não se para ai: para definir “pratos nacionais” é possível também incrementar as “receitas indígenas e africanas com técnicas e ingredientes trazidos (de onde?) por mãos portuguesas”. Mas por que elas precisariam de “incrementos”? São pobres na origem? As receitas, o que são? Invólucros vazios ou deficientes, imperfeitos?

Em termos resumidos: ou se descarta ingredientes portugueses para adotar nativos; ou se substitui, nas receitas indígenas e africanas, técnicas e ingredientes pelos trazidos – quiçá da Europa, ou Ásia ou África – por portugueses. O sujeito da frase culinária é sempre “os portugueses”.

É um caminho (e uma tese) muito tortuoso. Algo tem que ser sacrificado, substituído, para virar “nacional”. E sempre fica uma dúvida: o que orienta este processo? O “gosto” ou apreciação, ou uma necessidade férrea que, portanto, pode contrariar o gosto?

Mas é o que está na cabeça das pessoas que falam em sincretismo, em contribuições étnicas variadas para definir o nacional comestível. Por que não pensar simplesmente que o “nacional” é um conjunto de pratos apreciados pelos brasileiros, hoje ou no passado, pouco importando a origem?

A minha hipótese para uma resposta: é mais fácil teorizar sobre o assunto do que fazer levantamento exaustivo sobre o que de fato existe ou existiu. É mais fácil “criar pratos mentais-nacionais” do que investigar a diversidade empírica que mobiliza os brasileiros.

22/09/2009

Palavras-fetiche ou conceitos modernos?

Quero seguir no meu pequeno dicionário gastronômico. Preciso saber o sentido de termos culinários de uso corrente. Confesso encontrar dificuldades em conceituar certas coisas. Dai o pedido expresso de ajuda. Se você puder me esclarecer, não deixe de fazê-lo! Quero sabe o que é:

Baixa temperatura (a qual se refere?)

Bechamel (receita)

Canola

Forno a lenha (superioridade do)

Malte

Molho branco (receita)

Notas de (para aromas ou sabores)

Grelhado na chapa (diferença do grelhado na grelha)

Puxado (na manteiga, etc)

Telha

Claro,com o tempo outros mais aparecerão.

15/09/2009

O dilema do chef criativo

O que é criação gastronômica? Vamos deixar de lado aquele camarada que acha que possui o dom (sem trocadilho) de cozinhar. O “dom” é de origem misteriosa ou mística e escapa à nossa capacidade terrena de explicá-lo. Como Deus provavelmente não postará um comentário nesse blog, ficaremos sem explicação.

Entre as causas terrenas, a criação depende de que? Alguém dirá, taxativo: da educação! Ok, mas posso ser um sujeito muito bem educado e treinado e não possuir qualquer inclinação à inovação, a mudar coisa alguma. Pronto. Não serei o “criativo” que procuramos...

Poderei, ao contrário, selecionar na minha educação aquilo que outros não conhecem e apresentá-lo como algo criativo. Bom, estarei sendo impostor, por dissimular uma fonte de conhecimento. Muita gente faz “viagens de pesquisa” antes de “criar”. Desconfio muito quanto não traz, na bagagem, a origem das idéias captadas.

Mas poderei ser um sujeito que tem idéias malucas, e apresentar um prato que ninguém, rigorosamente ninguém antes imaginou. Isso é criação! Mas, de novo, caímos no “dom”? Ou há algum método para se chegar a isso?

Poucas são as teorizações sobre o assunto. Hervé This tem lá as suas, mas não consegue escapar do paralelo com as artes musicais ou a pintura. O que ele faz é uma transposição analógica de raciocínio, mas não consigo imaginar o equivalente comestível das sinfonias de Beethoven...

Gosto do modo como Ferran Adrià explica o seu processo criativo. Ele parte de uma idéia; por exemplo, relacionar num prato “mar” e “montanha”, e escolhe para expressar essa idéia “caviar” e “tutano”. Daí investiga se alguém já fez algo igual; quais as receitas que existem; decide o caminho a trilhar; escolhe o caviar, determina como cozinhar o tutano – tudo até chegar a algo palatável como “imagina” (já que não encontrou nada semelhante antes). Este exemplo está em Secretos de el Bulli.

Está claro que depois da “idéia” ou concepção, que ele julga o mais importante, tudo o mais é trabalho e determinação. É onde intervém a cultura e o preparo técnico do cozinheiro. Mas, sem a idéia ousada, nada feito. Nenhuma receita anterior levaria a ela. A criação é o momento da receita. A receita é como se imitará uma criação daí para frente.

Por isso é tão difícil criar em culinária. Em geral os grandes chefs são excelentes cozinheiros, apresentando de modo primoroso o que é de domínio comum, ainda que realizem variações sobre o tema. São interpretes que fazem os seus “arranjos” (mais uma vez a metáfora musical....). Raramente “criam”. E se “criam” ainda têm que enfrentar o gosto do público e deitar raízes nele.

Na gastronomia brasileira moderna, considero o sorvete de jabuticaba com wasabi do Alex Atala uma das poucas criações originais. Ele relacionou, gustativamente, duas coisas que possuem uma afinidade que não conhecíamos. E, creio, só era possível fazer isso em São Paulo – onde há jabuticabas e cultura japonesa (analisei isso exaustivamente no posfácio de Escoffianas brasileiras).

Mas Alex tem também o seu risoto líquido de funghi com redução de vinho. Uma coisa banal: o sabor do risoto com funghi que você acompanha normalmente com vinho. Qual a novidade? A papinha de arroz, depois de tanto tempo de ditadura do “riso al dente”. A técnica é nova? Já nem tanto. Trata-se de uma brincadeira com o senso comum, apenas isso. É bom? É.

Claro que “criar” é a grande tentação de quem quer ser chef. Mas será sempre uma circunstância excepcional. Exige preparo técnico, ampla cultura humanística e culinária para não inventar a roda. É fundamental conhecer as técnicas ultra-modernas? É claro que não. Pode-se inventar a roda com instrumentos simples ou sofisticados. Eles só ampliam as possibilidades de materialização das idéias, mas sem essas idéias nada feito!

Por isso é melhor se dedicar à formação sólida, em termos técnicos e culturais, enquanto o “estalo” não vem. E ficar satisfeito, mesmo que ele nunca venha.

11/09/2009

O cravo destemperado

Pelo senso comum, temos que “temperar” é dar sabor a um prato. Cada um tempera segundo seu gosto pessoal. As culturas também “temperam” para nós. Nos dizem o que devemos utilizar. “Bem temperado” é o mesmo que com o sabor marcante dos aditivos saporificantes.

Desde o século XIII a palavra temperar sugere, por via culta, dominar, moderar, misturar, unir, ligar nas justas proporções, equilibrar, governar e assim por diante. Só no século XVI aparece “tempero” como coisa individualizada, usada para temperar.

Em espanhol, o seu equivalente – adobar – aparece com o sentido de ornar, compor, “guisar as comidas”, ou ainda “marinar” as carnes para dar gosto (sazón) e conservar. E sazón é o ponto de madureza das coisas, o estado de perfeição; ou gosto e sabor que se percebe nas comidas.

A filiação dessa noções à medicina hipocrática, do século III a.C., parece clara. O médico inglês Eleazar Dunk, no século XVII, dizia que o ensino da medicina visava “a preservação da saúde e a prevenção das doenças”, exigindo dos médicos conhecer “os elementos (ar, água, terra e fogo), os temperamentos (frio, úmido, seco e quente), os humores (bílis negra, bílis amarela, fleuma e o sangue), os espíritos (naturais, vitais e animais), as partes do corpo, as faculdades e as ações”.

As especiarias, conforme utilizadas na Idade Média e alguns séculos depois, tinham esse sentido: “temperar” os humores e temperamentos, equilibrando-os com os quatro elementos, de forma a garantir a saúde. Era uma arte difícil a “arte médica”, e exigia a cooperação dos cozinheiros.

É provável que só bem recentemente o uso dos temperos tenha se “destemperado”. Ao menos o açúcar se transforma em “alimento” a reboque da revolução industrial. Mas, e o gengibre, a canela, a noz moscada?

Parece que, com o tempo – como nos sugerem alguns sentidos de “adobar” – o paladar se tornou o juiz da justeza da “arte médica”. Se é “gostoso”, é “bom”. E talvez por isso mesmo Kant nos adverte que o “agradável” aos sentidos não é o mesmo que “bom”. O agradável pode ser o destempero do bom. E é dessa perspectiva crítica que nasce a noção de “abuso” via exageração do consumo do que é agradável.

09/09/2009

A videira e suas variedades

A vinha (Vitis vinifera).— A versão mais aceita pelos estudiosos sobre a origem da uvas européias é que descendem de uma única espécie, que se encontra viva e cresce selvagem na Ásia Oriental, que tem sua origem na Era do Bronze na Itália e que foi recentemente encontrada em forma fóssil em um depósito de turfa no sul da França.

Mas certos indícios levam os estudiosos a contestar esta paternidade única de todas as nossas variedades cultivadas. A semente da dúvida está nas características mutantes da videira, capaz de variar geneticamente por caminhos desconhecidos, apesar de reproduzir fundamentalmente suas propriedades através das sementes. E como veio sendo cultivada desde a mais remota antiguidade, ganhando novas variedades por onde passa, parece improvável ter apenas uma origem. Além do que, a tese da multiplicidade tem fundamento particular nas pesquisas de campo feitas por Clemente, que encontrou várias formas semi-selvagens numa floresta da Espanha.

Podemos facilmente inferir que a vinha é uma planta que varia muito quando propagada pela semente pela incrível variedade de formas adquiridas por ela, documentadas desde eras remotas. Novas variedades são produzidas todo ano, como exemplifica bem a variedade dourada, criada recentemente na Inglaterra, e que nasceu de uma outra preta sem ter havido qualquer cruzamento. Van Mons produziu uma grande variedade a partir de sementes de uma única vinha, que tinha sido isolada de todas as outras, inviabilizando – ao menos por uma geração – qualquer cruzamento. E as suas mudas apresentaram “les analogues de toutes lees sortes”, diferenciando-se em quase todos os caracteres, seja na fruta, seja em sua folhagem.

As variedades cultivadas são extremamente numerosas; Count Odart acha possível que existam em todo o mundo 700 ou 800, talvez até 1.000 variedades, mas sequer um terço destes tem qualquer valor. No catálogo de frutas da Horticulture Gardens of London, publicado em 1842, foram enumeradas 99 variedades.

Onde quer que haja plantio de vinha, apareceram novas variedades; Pallas descreve 24 na Criméia, enquanto que Burnes menciona 10 em Cabul. A classificação das variedades tem deixado perplexos muitos escritores e Count Odart opta por um sistema geográfico; mas não entrarei neste particular, e nem menos nas enormes diferenças existentes entre as variedades. Apenas para mostrar quanto é diversificado o desenvolvimento desta planta, pretendo especificar algumas particularidades expressivas, todas provenientes do respeitado trabalho de Odart.

Simon classificou as uvas em dois grandes grupos, as de folhas rugosas e as de folhas lisas, mas ele mesmo admite que ao menos na variedade Rebazo, as folhas são tanto rugosas quanto lisas; Odart sustenta que algumas variedades têm nervuras não encontradas em outras plantas, enquanto que outras têm folhas rugosas quando jovens e envelhecem lisas. A Pedro-Ximenes tem como característica particular amarelar ao menos as nervuras de suas folhas no processo de amadurecimento, quando não deixa pintado de amarelo toda superfície da folha. A Barbera D’Asti é reconhecível por várias características; entre outras, “"por algumas das folhas, e sempre as dos ramos mais baixos, que se tornam repentinamente de uma cor vermelho escuro".



Muitos autores classificam as uvas a partir do formato do bago, redondo ou oval; Odart admite o valor desta divisão, mas aponta para a Macabeo, que muitas vezes produz bagos pequenos e redondos e, ao mesmo tempo, bagos ovalados e grandes na mesma planta. Algumas, têm uma característica tão marcante que as distingue, como é o caso da Nebbiolo que “apresenta uma ligeira aderência na polpa que circunda a semente, perceptível quando o bago é cortado na transversal”. Uma uva do Reno é citada por amadurecer bem apenas quando o solo é seco, já que costuma apodrecer quando chove demais na época da colheita; ao contrário de uma variedade originária da Suiça, que só amadurece se houver umidade prolongada. Esta última brota apenas na primavera, mas seu fruto amadurece rápido; há ainda as que se dão bem demais com os efeitos do sol de abril e por isso acabam sofrendo com geadas. Enquanto a variedade Styrian tem talos quebradiços, o que faz os cachos caiam com facilidade - e a vinha citada é particularmente atraente para abelhas e vespas - outras têm galhos extremamente fortes, resistentes ao vento.

Outras tantas características poderiam ser citadas, mas os fatos apresentados são mais do que suficientes para mostrar como são variáveis os pequenos detalhes estruturais e constitucionais da videira. No período da grande doença do vinho na França, determinados grupos de antigas variedades sofreram muito mais do que outras. Entre elas, enquanto a de “Chasselas, tão variado, não teve sequer uma afortunada exceção”, outras sofreram muito menos; a verdadeira Borgonha mais antiga, por acaso, esteve praticamente livre da doença e a Carminat resistiu igualmente ao ataque.

As uvas americanas, que pertencem a espécie diferente, escaparam integralmente da doença na França, o que faz supor que muitas dessas européias que melhor resistiram à doença devem ter adquirido – num nível inferior – as mesmas peculiaridades constitucionais das espécies americanas. (Charles Darwin, Variation of animals and plants under domestication, capitulo X, 1868. Tradução Breno Raigorodsky)

03/09/2009

Vício nominalista

Carne-seca, carne-de-sol, carne-do-Ceará, granja, jabá, charque. O chefs adoram levar essas coisas ao fogão como se fossem todas diferentes. Se enfocarmos os processos de produção subjacentes talvez tenhamos apenas dois diferentes: "carne seca" e "carne de sol". O mais são nomes diversos das mesmas coisas.

01/09/2009

Tipicidade na cozinha brasileira

No arroz carreteiro usa-se arroz cateto ou amarelão? O prato admite o tomate? Li num blog que um chef ensina a fazer uma moqueca “refrescante”, sem azeite-de-dendê. Você acha que isso é possível? Ah, alguém poderá exclamar, mas esta é a moqueca capixaba!

Na new wave da cozinha brasileira, um tema obrigatório será a tipicidade. O que é ela? A história pouco auxilia no entendimento. Acredito que “típico” será tudo o que os brasileiros reconheçam como tal, não importando a origem. Típico é o que se pratica ou desejaria praticar nos dias correntes. Conhecer isso é que são elas.

Um mínimo de “consistência estatística” é desejável. Um mínimo de mapeamento etnográfico é necessário. Como não há instituição pública disposta a fazer isso, seremos condenados ao “achismo”. E chefs adoram “achar”...

Nos países de larga tradição gastronômica, muitos livros existem sistematizando e consolidado as respectivas culinárias. Entre nós, não. Então, qual a “verdadeira” receita do biscoito de polvilho, da massa de empadinha, etc etc etc? É por esta fresta que o “típico” foge, escapa entre nossos dedos.

Daí ao mito da diversidade e riqueza quase infinitas é um passo. Ou, “cada um na sua, todos na Globo”.

20/08/2009

Trinchar


Sempre achei uma barbaridade a tesoura de trinchar e sua potencialização, a faca elétrica. Por que levar o esquartejamento à mesa? Imaginei rememorações rituais da guilhotina. Sempre preferi chegar a um ponto de cocção onde é possível desmontar o animal nas juntas, com o auxílio de uma faca e um garfo.
Pois não é que Gualtiero Marchesi apresenta uma interessante análise (La tavola imbandita. Storia estetica della cucina) da “representação convivial como rito de demolição”? Ele centra a análise na dimensão coreográfica, no espetáculo decorativo que é o trinchar – atividade que exige conhecimento de anatomia animal e que, após o Renascimento, recai sobre um especialista.
Especialista que se pauta por um código do desmantelamento. Absolutamente necessário quando a prioridade gastronômica, a seleção das melhores partes, se dá segundo a expressão da hierarquia social à mesa. O trinchador é um distribuidor de “justiça” à mesa pos-renascentista. Lendo e aprendendo.
E o que ela faz à nossa mesa? Acho que quase não existe mais, porém ainda se fabricam. Mas a faca elétrica - esta se propaga... e me evoca Freddy Krueger entre os comensais. Sinal dos tempos, pois nele também existe algo de "justiceiro".

13/08/2009

De puxados e puxadinhos

Conversávamos, Teresa Corção e eu, no DOM, e o garçom explicou um prato, que era finalizado sendo “puxado na manteiga de garrafa”.
O que é o “puxado”, de onde vem essa palavra? Todos sabemos que não é uma tradução de qualquer outro léxico culinário. Atala concorda. Teresa lembra que é o mesmo que saltear.
Ok. Mas tenho, cá para mim, que vem da imagem de se “puxar” massa de cimento, areia e cal na construção civil. Os homens que, há décadas, começaram a “puxar” cabos de frigideiras eram os mesmos acostumados a “puxar” cabos de enxada para fazer massa em construções civis. Com base na similitude de gestos, deu-se a importação do léxico.
Quem tiver uma melhor explicação que se apresente.

03/07/2009

A identidade culinária

No que a culinária contribui para a identidade de um povo? Há quem ache que ela tem o mesmo papel que a língua, como Santi Santamaria. Ele se refere ao conjunto de características e circunstâncias que distinguem uma localidade diante do mundo e das demais localidades.
Mas vejo, às vezes, uma aplicação diferente, como se a culinária devesse sustentar a “consciência da persistência da própria personalidade”. Identidade igual a ego.
Muita gente acha, como Santamaria, que a fastfoodização do mundo destrói as identidades, ao criar a homogeneização do comer. Mas isso não acontece só com o MacDonald's. Acontece também com a pizza.
Ontem vi uma reportagem na TV, onde um camarada ensinava a fazer pizza de arroz-com-feijão. Quer dizer que a nossa identidade está no recheio, e não passa pela massa? Pizza de brigadeiro, de goiabada, de pêssego com catupiry, são coisas “nossas”, que alimentam nossa identidade? Ou são barbarismos sem fronteira? Coisas que, só de lembrar, me dão engulho (põe ai minha identidade fora disso, por favor).
Só quem come arroz-com-feijão ou come as comidas típicas locais, as comidas das avós, é ou se sente brasileiro?
Seria melhor reconhecer que há múltiplos planos identitários. E que talvez as pessoas entrem realmente em crise de identidade quando não comem o que gostam por muito tempo. E se gostam de MacDonald's, sua identidade culinária mudou, não desapareceu. São como qualquer pessoa que come pizza em qualquer lugar do mundo, com horríveis recheios...
Há pessoas de personalidade forte, muito centradas, às quais é praticamente indiferente o que comem. Suas identidades não passam pelos pratos.
Um povo come o que come, e isso vai mudando com o tempo. Assim como a identidade de cada um.
Mas há momentos na história em que a identidade culinária de um povo se torna uma questão de alto significado político. Como foi na Cataluña saída do franquismo, quando os cozinheiros trabalhavam com afinco para “desenterrar” as receitas locais, assim como os filólogos se ocupavam da língua, os historiadores da história local, etc. Será que, no Brasil, vivemos um momento desses?